quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Salvar os mercados e afundar o Brasil

Estes "jornalistas" não passam de réles vira-latas a serviço dos interesses do capital finaceiro e internacionais.


Carta Maior, 07 de novembro de 2013


Salvar os mercados e afundar o Brasil


Por Saul Leblon



Arquivo
                                                                                                                                   Carta Maior não tem por hábito reproduzir  textos da mídia conservadora, mas abre uma exceção hoje pelo elevado teor pedagógico que o caso encerra.

A guerra das expectativas, como se sabe, orienta a pauta dominante nos dias que correm.

O julgamento-espetáculo do chamado ‘mensalão’, um notável esforço de desossar o campo progressista a ponto de torná-lo incapaz de se equilibrar em um palanque, proporcionou retorno abaixo do esperado.

A sofreguidão midiática, e um desempenho excessivamente desfrutável das togas, atravessou o Rubicão a partir do qual o discernimento enxerga a mão do cambalacho.

A cavalaria do jornalismo econômico assumiu, desde então, o comando das operações.
Justifica-se.

Se a meta é estrangular o horizonte das esperanças nacionais, e por extensão quem conduz há 12 anos a agenda do desenvolvimento socialmente progressista, a guerra das expectativas é o instrumento competente.
A frota mais adestrada nesse campo de batalha é o jornalismo econômico.

Filho dileto da ditadura
,  quando exorbitou na narrativa áulica do regime, firmou-se desde então como a editoria predileta dos donos de jornais, por razões imagináveis de tesouraria e prestígio.

Ainda hoje, é  a área das redações em que vigoram os mais altos salários, e aquela mais coesa na genuflexão à agenda neoliberal.
Da vassalagem ao intervencionismo fardado, que arrochava salários com a repressão aos sindicatos, o noticioso econômico baldeou-se sem escala para a defesa incondicional dos mercados desregulados, em especial, o financeiro.

Talvez haja mais coerência do que se imagina nessa dupla militância.

O que antes se esmagava, literalmente, com instrumentos e métodos rudimentares, hoje se dobra de joelhos com a sofisticada hegemonia assegurada às leis de mercado.

Ou não será essa a essência da recorrente defesa de um Banco Central  independente  - do Estado, da democracia e das urgências da sociedade?
O cerco em curso, portanto, está em mãos habilitadas. Trata-se de elevar ao paroxismo a incerteza intrínseca aos detentores da riqueza.

Instados permanentemente a optar entre a alocação do capital  em investimento de longo curso (infraestrutura , por exemplo),  ou a opção mórbida pela  liquidez rentista de curto prazo, eles são o alvo da esférica e convicta fuzilaria das redações.

Induzir o dinheiro graúdo à primeira opção, associada a um projeto social que o conduza, constitui o desafio de vida ou morte do governo.

Abortar  as chances de que isso aconteça, adicionando diuturnamente caçambas de incerteza ao estoque endógeno dos detentores da riqueza, é a missão à qual se dedica de corpo e alma a o noticioso econômico conservador com suas certezas graníticas sobre o que é melhor para o país, a sua gente e o seu desenvolvimento.

O troféu em  jogo é o escrutínio de 2014, quando opções mais amigáveis, tingidas de verde ou rosa, podem assumir o bastão ao intervencionismo petista.

Não se pode dizer que o campo seja desfavorável ao time das redações.

O Brasil vive uma travessia de ciclo de desenvolvimento que agrega a vulnerabilidades de lavra própria (o câmbio valorizado, por exemplo), outras decorrentes da transição na economia mundial.

Não há receita de custo zero capaz de impulsionar o  passo seguinte do desenvolvimento nesse campo movediço.

Debater as opções em curso, escrutinar seus ônus e bônus, sedimentar assim um chão mais firme e um protagonista social que o percorra, é o que dará coerência à macroeconomia do país de agora em diante.

Os centuriões encarregados de exacerbar a incerteza interditam esse debate e vetam as soluções progressistas cogitadas (leia a nota deste blog ‘A urgência à procura de um debate’).

Seu exclusivo, e ansioso, interesse é acelerar a contagem regressiva do tempo que falta para o país se revelar uma nação aos cacos, à espera do cola-tudo capaz de saneá-la: uma boa purga de arrocho fiscal e um choque de juros.

Essa pauta latejava sua sofreguidão nesta 4ª feira, quando o governo resolveu rebater, com números, o necrológio fiscal do país estampado nas páginas de alguns dos principais veículos conservadores.

Foi com o evidente propósito de avalizar esse diagnóstico que o jornal Valor Econômico se preparou para lançar uma pá de cal na cova teimosamente recusada pelo governo.

Um quadro de prestígio da ortodoxia nativa, o economista Joaquim Levy, foi escolhido para ser o principal entrevistado sobre o tema na edição da 4ª feira quente.

Não foi uma escolha aleatória.

Levy carrega predicados de peso. Formado em Chicago, meca do neoliberalismo
, atuou como Secretário do Tesouro Nacional do governo Lula, durante a gestão de Antonio Palocci na Fazenda.

Levy  encarnava então aquilo que muitos chegaram a classificar como a rendição do PT ao neoliberalismo.

Era a mão do arrocho fiscal na goela dos ideais e compromissos petistas.
Capacitou-se para isso diretamente na fonte servindo no FMI por sete anos (1992/1999).

Hoje, dirige um braço de gestão de recursos de investimento do Bradesco (BRAM). Foi desse poleiro privilegiado do mercado que ele falou ao Valor.

Bem,  o que disse –sem renunciar às diretrizes ortodoxas-  desagradou profundamente a pauta preconcebida para corroborar o diagnóstico de um Brasil em marcha batida para o abismo.

A entrevista de Levy e as negativas do governo em aceitar a autópsia midiática elevariam a temperatura no ambiente do jornalismo isento.

Tanto assim que no site do jornal Valor, na mesma 4ª feira,  guardiões do desastre  iminente  postaram uma acalorada nota no blog apropriadamente chamado: ‘Casa das Caldeiras’.

O pito no governo e em um Levy não nominado foi quase uma descompostura. Um sabão em quem resiste, ainda, em enxergar aquilo que o jornal tanto se esforça por demonstrar  e  difundir: ‘se não for hoje, de amanhã o Brasil não passa’. Ou, como diz o post do alto de sua condição de alter ego do mercado ,e como tal, sempre ancorado em um estratégico off de fonte inexcedível em saber e fazer:  “É inegável que a piora dos indicadores e das expectativas estão agendando por bom tempo juro alto, inflação alta e baixo crescimento. Neste ano, sabemos que a agricultura e os investimentos darão fôlego à atividade. E no ano que vem? Como ficamos no ano que vem, com a desconfiança crescente entre financiadores e potenciais investidores...”

Repita-se, Carta Maior não tem por hábito transcrever  a mídia conservadora . Mas os excertos abaixo, da entrevista mencionada e da admoestação professoral da parte ofendida, merecem ser coligidos.

Trata-se do testemunho de um garrote e de um tempo em que o jornalismo conservador assumiu a frente da guerra. Para salvar os livres mercados deles mesmos. E do governo que os ameaça.

Seguem-se excertos  dessa jornada pedagógica de isenção das redações.

Primeiro, a entrevista de Joaquim Levy:


Levy descarta abismo fiscal, mas defende metas claras
Valor Econômico  06-11-2013
De São Paulo

O Brasil não está à beira do abismo, como o debate acalorado acerca das estratégias de política econômica às vezes pode indicar, mas é certo que falta ao governo esclarecer quais são seus objetivos no médio prazo, especialmente na área fiscal, avalia Joaquim Levy, secretário do Tesouro Nacional durante o governo Lula e hoje diretor-superintendente da Bradesco Asset Management (BRAM)
(...)
Questionado se a política fiscal preocupa mais do que outros temas, como a inflação ou o baixo crescimento, Levy rema um pouco contra a maré do mercado ao dizer que "há perspectivas positivas nas três áreas". Diferentemente do que o discurso menos agressivo poderia indicar, no entanto, Levy avalia que a discussão sobre trazer a inflação para mais próximo da meta e, eventualmente, trazer a meta um pouco mais para baixo parece o que chama de "firula teórica", mas não é. Segundo ele, seria um ingrediente fundamental para reduzir os juros reais e elevar investimentos, inclusive o produtivo.

A seguir, os principais trechos da entrevista:

(...)
Valor: O governo está no caminho certo?

Levy: Tem todo um esforço nesse sentido. Não é uma tarefa fácil ter que simplificar os seus objetivos. Mas qualquer engenheiro ou matemático sabe que, ao se traçar muitos objetivos com muitas restrições, a equação pode ficar sem uma raiz. Acho que alguns movimentos, como essa questão do BNDES dar mais espaço para infraestrutura e para instrumentos de financiamento de infraestrutura, com as famosas debêntures, são passos importantes. Tem que ver a velocidade desses passos. O mercado de capitais brasileiro está aumentando e estamos apostando bastante nessa história de debêntures de infraestrutura. Para financiamentos, vamos precisar de inflação na meta e tudo, mas acho que é um mercado que vai deslanchar.
Valor: Olhando para a economia hoje, o que preocupa mais, as pressões inflacionárias, o crescimento baixo ou a política fiscal?

Levy: Acho que temos perspectivas positivas nas três áreas. A preocupação de a inflação ultrapassar o teto da meta é menor do que no passado. Por outro lado, uma inflação de 6% ou 6,5%, acho que todo mundo concorda, é uma inflação bastante alta (...) essa discussão de trazer a inflação para mais próximo da meta e, eventualmente, trazer a meta um pouco mais para baixo parece firula teórica, mas não é. É um ingrediente para baixar as taxas de juros reais, que são importantes para ter investimento de longo prazo. E isso vale tanto o investidor de uma NTN-B [título indexado à inflação] quanto para aquele que vai desenhar o financiamento de uma fábrica.

Valor: E temos outros desafios também, como um taxa de poupança muito baixa...

Levy: A China é um país de inflação baixa. Por quê? Uma das razões é que o país tem poupança. O Brasil precisa aumentar a sua taxa de poupança. O problema é que muitas vezes as pessoas descobrem que, para aumentar a taxa de poupança, é preciso consumir menos. O investimento cresceu mais que o consumo, é fato. Mas boa parte do investimento foi financiado pela conta externa. E à medida que a conta externa não pode continuar crescendo vai ser preciso outro meio para aumen tar a poupança. Ao mesmo tempo, é preciso entender também que, no momento em que se dá maior estabilidade, as pessoas poupam mais (...)


Valor:  A questão fiscal é preocupante? Os últimos números apontam uma economia para pagamento de juros ainda menor.

(...)  O Brasil está em perigo à beira do abismo?

Acho que não está. Mas qual é, afinal, o objetivo fiscal do governo? É diminuir a dívida? Ou é imprimir uma trajetória para o gasto corrente? Algo que dê uma visibilidade de três, quatro, cinco anos. Acho que isso é o mais importante. Qual é o objetivo para os próximos três anos? Não precisa ser o superávit primário, pode ser outra métrica. Mas tem que ter uma explicação, do tipo essa é a métrica que eu acho importante, e os motivos pelos quais ela é importante, e quais vantagens trará.

Valor: Corremos o risco de ver o rating do país rebaixado em razão da política fiscal?

Levy: Acho que a gente não tem motivo nenhum para ter rating rebaixado (...) O papo tem que ser o que fazer para aumentar o rating. E é um papo de sociedade, não só de governo, mas Congresso, economistas e diálogo com as próprias agências. Acho que, comparados com alguns países, estamos bem. Por exemplo, a Polônia tem rating A, um a dívida que não é tão melhor do que a nossa, mas fica ao lado da Alemanha, o que pode ajudar. Esse é o papo legal. Brasil é isso, é ir para frente. Quando converso com investidores, é o que querem ouvir.

Valor: O humor desses investidores deu uma melhorada?

Levy: O investidor tem convicção que o Brasil tem coisas muito boas e que se a gente não cometer equívocos, essas coisas vão continuar produzindo resultados. O investidor talvez tenha percebido que, mais uma vez, se a gente se antecipar a certos movimentos, como o Banco Central fez recentemente, tem condições de navegar um eventual aperto monetário com relativa segurança. Pode chacoalhar um pouquinho, aderna, mas não emborca. (...) Quando o investidor olha outros países emergentes, sabe que o Brasil tem todas as condições para navegar nem que seja com um pouquinho de vento contrário, como a alta dos juros internacionais.

Valor: Além da alta dos juros lá fora, quais são os principais riscos que podem atingir o Brasil no ano que vem?

Levy: Quando o mundo se normaliza, a gente deixa de ser a única atração da cidade. Mas a gente ainda tem um showzinho bacana. E se continuar treinando bem, desenvolvendo alguns quadros novos, continuaremos como atração bacana. A questão global é que é um mundo competitivo, temos que estar nos fortalecendo. À medida que infraestrutura continuar avançando isso dá sinalizações muito importantes para o investidor (...)


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Aqui, o ‘ pito’ não nominado, dirigido ao governo e a Joaquim Levy, postado no  blog do Valor,  ‘Casa das Caldeiras’
Casa das Caldeiras

Site do Valor Econômico 06-11-2013

“Deterioração de expectativa é mais inflação e juro com PIB menor

A antecipação do calendário eleitoral antecipou também a exaustão dos espectadores com a reprise de provocações e declarações de boa intenção para o futuro governo que, de novidade, os virtuais candidatos à Presidência da República têm pouco a apresentar no momento. Pior, a antecipação do calendário eleitoral ante resultados  que o governo Dilma Rousseff tem dificuldade em entregar está fazendo um estrago nas expectativas e indicadores econômicos e financeiros. A incerteza quanto à economia que o governo pretende fazer para sinalizar o pagamento de juros da dívida, equivalente ao superávit primário, não coloca o país num quadro de insolvência, mas vem minando fundamentos. E negar essa evidência é um erro. É conspirar contra os acertos.

A deterioração fiscal e a projeção para a inflação ao final de doze meses, instalada no patamar de 6,2% desde o início de setembro, tornam-se poderosas alavancas para as taxas de juros, que, no mercado futuro, já sinalizam Taxa Selic de 12,75% ao ano em 2015, permanecendo nesse patamar nos anos seguintes. A arrancada do dólar frente ao real, com essa dupla encostada em R$ 2,30 e alta de 7% em quinze dias, pode sinalizar tudo, menos um futuro tranquilo para qualquer governo – venha de onde vier o presidente.

“Supor que o ambiente em que estamos vivendo neste momento não  afeta ou não afetará o Brasil é um equívoco. De cara, os juros estão nas máximas alcançadas neste ano e isso significa, no mínimo, custo de financiamento mais caro para o Tesouro Nacional e para tomadores de crédito de prazo mais longo. É inegável que a piora dos indicadores e das expectativas estão agendando por bom tempo juro alto, inflação alta e baixo crescimento. Neste ano, sabemos que a agricultura e os investimentos darão fôlego à atividade. E no ano que vem? Como ficamos no ano que vem, com a desconfiança crescente entre financiadores e potenciais investidores no país. E não só financeiros?”, pergunta, e não aguarda resposta, o experiente executivo de uma instituição financeira nacional”.

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