quinta-feira, 15 de setembro de 2016

A palavra que falta no PPT de Dallagnol


http://cartamaior.com.br/?/Editorial/Falta-uma-palavra-no-power-point-de-Dallagnol/36838

 

Carta Maior, 15/09/16

 

A palavra que falta no PPT de Dallagnol



Por Joaquim Palhares



 
O conflito com as ruas e com as urnas está inscrito na natureza constitutiva do golpe em curso no Brasil, cuja fidelidade pertence aos detentores da riqueza, não ao país, tampouco a sua gente.

A agenda de expropriação de direitos e alienação de patrimônio público que define essa endogamia não pode ser submetida às urnas - nas quais já foi derrotada em quatro eleições presidenciais sucessivas. Menos ainda à convivência política com aquele que personifica esse antagonismo na alma e no coração do povo brasileiro: Luiz Inácio Lula da Silva, uma liderança de carne e osso, com os limites da carne e do osso, mas ainda assim a maior liderança popular da nossa história, porque levou mais longe o compromisso com a igualdade social.

Pepe Mujica, em uma de suas viagens ao Brasil, carimbou no golpismo, então ascendente, uma advertência lapidar: ‘Devemos desconfiar sempre dos que pretendem corrigir o voto popular'.

Munidos de um power point colegial, e de uma retórica de macarthismo imberbe, os proficientes promotores da Lava Jato se avocaram nesta quarta-feira, mais uma vez, o papel execrado por Mujica.

Na condição caricata, acentuada pela retórica de polícia política, lançaram-se ao  derradeiro esforço de entregar a encomenda contratada desde o início à Operação Lava Jato: impedir que a urna eletrônica de 2018 submeta mais uma vez o nome de Lula ao escrutínio popular.

A derrubada da Presidenta Dilma foi o degrau anterior dessa buliçosa empreitada, que está condenada a ir além de todos os limites constitucionais

Por uma razão bastante forte: o projeto golpista não é incompatível apenas com uma disputa em terreno limpo contra Lula e contra o que ele representa.  Ele é alérgico ao contato direto com o povo e com a soberania, pelo simples fato de que nasceu para ir contra a vontade do povo brasileiro.

O passo seguinte dessa escalada – não é temerário prever -  conduzirá ao enjaulamento do processo político, trazendo para o quórum seguro de uma escória parlamentar, a eleição do sucessor de Temer, pelo voto indireto, protegido do veredito da sociedade e blindado contra o clamor da rua.

Delações coagidas e culpas presumidas, amarrotadas em um power point infantilizado, avultam dos labirintos jurídicos da Lava Jato, onde o desejável combate à corrupção foi abastardado em alavanca partidária de execração política para o banir lideranças e forças populares incompatíveis com o Brasil das elites.

A destruição da  maior liderança popular da história brasileira é um imperativo da empreitada grosseiramente previsível.

Para cumpri-la empunha-se a lei do vale tudo.


O senhor Dallagnol condensou essa determinação omnívora - peculiar ao código de uma comunidade legal que defende ‘provas’ obtidas por meios ilegais - em uma sentença que permite interpretar como:  'Não temos prova, temos a convicção'.

Qual ?

A de que Lula era o cérebro, o ‘comandante máximo’, o general de todo o suposto esquema  de corrupção na Petrobras - que começou antes de seu governo, mas isso não vem ao caso, nem cabe nos esquematismos de um power point colegial.

Vem ao caso, porém, na defesa do Estado de Direito.

Quando o Ministério Público se propõe acusar tão gravemente  um ex-presidente da República de ser  o “chefe máximo da corrupção no país” e o faz na fase inaugural da persecução criminal, que na verdade não investigou e muito menos denunciou tal conduta criminalmente condenável, portanto, sem possuir provas ou indícios, o Estado de Direito grita.


E deveria ser ouvido.

Ao senhor Dallagnol cumpriria uma voz da Suprema Corte advertir que 'convicção' para condenar quem forma é o juiz. Tão somente o juiz.

Pelo menos no Estado de Direito em vigor no país é assim.

Não o era na OBAN, durante a ditadura. Não. Ali, nas salas de tortura, um delegado, Sergio Paranhos Fleury, formava suas convicções. E as executava, como sentenças inapeláveis, com as próprias mãos.

Hoje a imprensa corporativa também possui convicções e as executa, com suas próprias manchetes.

O senhor Dallagnol não é juiz; Sérgio Moro não é Sergio Fleury; a República de Curitiba não é a OBAN.

Mas arvora-se, neste caso, o direito de condenar, repita-se, um ex-presidente da República como 'general supremo' de um esquema de corrupção, no qual teria auferido propinas no valor de R$ 3,7 milhões.

Apenas um dos supostos subalternos seus  - pois todos o seriam na fábula macartista dos promotores de power point - como lembra a jornalista Helena Chagas, citando Pedro Barusco, pagou só de multas à Lava Jato, cerca de U$S 100 milhões de dólares.

Que ‘general’ é esse, cujo soldo é cem vezes inferior ao de um soldado?

Seria apenas ridículo, se não fosse um atentado à democracia.

A precariedade evidenciada no amadorismo de um power point é tamanha que o juiz Moro, em nome da sua reputação, terá dificuldade em aceitar a denúncia ancorada em retórica adjetiva, a dissimular a inexistência de provas efetivas, principalmente porque esse fato não faz parte das investigações e da denúncia.

Mas Moro o fará, pela simples razão de que para isso se constituiu a Lava Jato. Ademais, aceitação não é condenação.

A falta de provas de que o ex-Presidente seria o “general da corrupção”, todavia, deveria constranger um guardião do Estado de Direito.

Ela avulta não apenas da convicção de Dallagnol. Mas sobretudo, do fato de não se ter requerido a prisão de Lula.

Não faz sentido o Ministério Público Federal não pedir a prisão de um réu tipificado como comandante máximo do exército de corruptos da nação. Não o fez porque não tem provas e nem indícios, evidentemente porque essa parte da descabida acusação sequer faz parte das investigações e da denúncia oferecida.

Além disso, parte das acusações que foram apresentadas no dia de ontem estão na competência da Suprema Corte.

Se o nome disso tudo não é golpe será preciso inventar um outro mais forte para designá-lo.


Quem sabe: GOLPE !

O conjunto acentua as tintas da crise estrutural vivida pela sociedade brasileira em que ao esgotamento do modelo econômico se junta a falência de seu sistema político que contaminou a isenção do judiciário, arrebatado agora por centuriões que se avocam a tarefa de ‘corrigir o voto popular’.

Nenhum simplismo de power point resolverá essa encruzilhada, diante da qual se joga o destino brasileiro no século XXI.

A crise em curso  requer  uma repactuação democrática da sociedade e do seu o desenvolvimento, razão pela qual não encontra remédio no passado - e tampouco no anacronismo violento de um presente espremido na   restauração neoliberal que se pretende impor à  nação.

Para impedir que o Brasil escorra no ralo conservador é inadiável acelerar a construção de uma frente ampla, assentada em forças populares e democráticas, que se ofereça às ruas e às urnas como uma alternativa crível ao ajuste baseado na liquefação da renda assalariada, na sonegação do futuro à juventude, no atropelo da Constituição e do  Estado de Direito

Exortamos os democratas e progressistas a se tornarem parceiros dessa trincheira, através da qual é possível acrescentar a palavra que falta no power point do senhor Dallagnol : farsa !






​Esquerda Diário, 15.set.2016​

Sem provas mas convicto, Dallagnol é a nova cara do autoritarismo judiciário


​Por ​ André Augusto



​“Vivemos uma janela de oportunidade, o caso Lava Jato deixou a sociedade altamente sensível e esperançosa de mudanças”, diz Deltan Dallagnol, procurador-chefe da Lava Jato em Curitiba, sombra política e braço direito de Sérgio Moro.

A declaração é quase um mantra do procurador de 36 anos que chefia a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba. Mantra que carrega na mala em suas viagens pelas universidades de Harvard, Yale, e outras nos Estados Unidos, cujos alunos da faculdade de direito se especializam em “cursos contra a lavagem de dinheiro” . Cursos assim são ministrados pelos professores destas renomadas universidades sob comando do Departamento de Estado norteamericano, que promoveu encontros entre promotores, procuradores e policiais federais brasileiros para “melhor instrução” sobre o combate à corrupção.

Vimos em outras publicações, como a vazada pelo WikiLeaks, que Sérgio Moro recebeu este tipo de treinamento por este órgão de estado, altamente interessado nos efeitos econômicos benéficos que o “combate à corrupção” traria ao capital estrangeiro no Brasil.

Basta dizer que é o artigo 7º, § 1º, da Lei n. 9.613, de 3 de março de 1998 (Lei de Lavagem de Dinheiro) que permite aos procuradores da Lava Jato em Curitiba, incluindo Deltan Dallagnol, apropriar-se de 20% do dinheiro restituído de cada delação premiada, segundo anunciado pelo próprio Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, numa verdadeira fábrica de dinheiro para a Lava Jato. Do lado dos monopólios estrangeiros, o benefício é taxativo: com a enorme crise da Petrobrás e as tratativas para a venda de porções e ativos, além do pré-sal, a empresas estrangeiras, é possível enxergar como a Exxon Mobil, a Chevron e a Royal Dutch Shell, petroleiras com dívidas gigantescas, extrairão o seu futuro.

​Contabilizando-se os 20% "devidos" por Paulo Roberto Costa e outros delatores, além das empreiteiras Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa, em acordos de leniência fechados, a força-tarefa da Lava Jato receberia mais de R$ 300 milhões na conta da Vara Federal de Curitiba. 
 
Dallagnol e a Lava Jato, portanto, usam a Lei de Combate à Lavagem de Dinheiro para justificar a apropriação de parte da multa. Um trecho da norma diz que a União deve regulamentar a destinação de "bens, direitos e valores" alvo de apreensão judicial e assegurar sua utilização "pelos órgãos encarregados da prevenção, do combate, da ação penal e do julgamento de crimes”.
 
Além do trabalho na Lava Jato, Dallagnol se dedica a viajar o Brasil para divulgar a campanha Dez Medidas contra a Corrupção, que alcançou 2,2 milhões de assinaturas e já tramita como projeto de lei de iniciativa popular na Câmara dos Deputados. Em palestra no Rio de Janeiro para investidores, em julho, o procurador disse que já fez, “sem ganhar nada por isso”, mais de 150 palestras só sobre as medidas anticorrupção e “perdeu as contas” das apresentações sobre outros temas ligados ao combate ao crime. 
 
Os ouvintes de Dallagnol, entretanto, estão entre os que mais poderiam pagar pelos serviços prestados. A audiência de grandes patrões vai desde o Congresso Brasileiro de Cirurgiões à Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital. “Vou decepcionar os que esperam mais um momento sobre como lucrar nos negócios. Se vocês seguirem minhas dicas, infelizmente vão falir. Tenho ações de Petrobras, do BTG Pactual e da Queiroz Galvão”, disse o procurador.
 
Sobre as 10 propostas contra a corrupção em si, trazem o “benefício” de colocar o Ministério Público acima das já escassas e tímidas proteções legais da própria constituição, como indica a Associação de Juízes para a Democracia. Entre os efeitos das medidas de Dallagnol e Moro, se encontram a limitação ao uso do habeas corpus; a distorção da noção de trânsito em julgado trazida pela figura do recurso protelatório (que, ao lado da possibilidade de execução provisória da pena, fulmina o princípio do estado de inocência); a relativização do princípio da proibição da prova ilícita; a criação de tipos penais que, na prática, invertem o ônus da prova que deveria caber à acusação; o desrespeito ao contraditório; e a violação à vedação do anonimato que se implementa com a possibilidade de fonte sigilosa. O Instituto Brasileiro de Ciências Criminais também diz que se tratam de ações que alteram o processo penal, sem combater a prática. 
 
Muito mais que isso, os métodos patrocinados por Dallagnol são os mesmos que a polícia usa para disciplinar o crime organizado e através dele impor o terror permanente sobre o povo negro e pobre nas favelas do país. Abrem o caminho para que sejam usados numa escala muito superior contra os trabalhadores e suas organizações. Entre as mais escandalosas, está a medida que autoriza “utilização de provas obtidas ilicitamente, desde que não haja má fé por parte do investigador que a colheu”, criticada até mesmo pelo insuspeito ministro do STF Gilmar Mendes.
 
Essa é a "janela de oportunidade" de Dallagnol: “Em razão da minha cosmovisão cristã, eu acredito que nós temos uma janela de oportunidade, que Deus está abrindo para mudanças. Se a igreja luta por isso, Deus está respondendo”.
Esta mesma figura, religioso fervoroso da Igreja Batista, foi que de maneira “científica” deduziu “sem nenhuma prova, mas com convicção”, que Lula é o “maestro de uma quadrilha criminosa” que controlou todo o esquema de corrupção da Petrobrás. Se é certo que Lula e o PT assumiram toda a corrupção própria dos governos capitalistas de maneira tão completa como os partidos da direita, é mais certo ainda que o autoritarismo do Judiciário, presentes neste singelo batista, não tem nada a ver com o combate à corrupção: trata-se apenas de substituir um esquema de corrupção com a cara petista por um esquema com o rosto da direita, fortalecendo o papel autoritário do poder judiciário como árbitro para a solução de crises que colocam em cheque a estabilidade do regime burguês.

Os juízes não são eleitos por ninguém. Pelo contrário, são escolhidos pelos donos do poder. Como muito, são funcionários de carreiras cheias de filtros sociais, para que seus cargos sejam ocupados só pela elite. Gozam dos mais altos privilégios da “república dos ricos”, alguns deles vitalícios. São os patriarcas da censura à esquerda nestas eleições, e fortes impulsionadores das reformas trabalhista e previdenciária de Temer.

É preciso questionar todos os privilégios do Poder Judiciário, exigir que cada juiz seja eleito por sufrágio universal e seja revogável, perdendo suas verbas de auxílio e exigindo que recebam o mesmo salário de uma professora. Nem o PT, que fortaleceu esta instituição durante todos os seus governos, nem a direita reacionária do PMDB e do PSDB, podem fazer isso.


http://www.jornada.unam.mx/2016/09/15/opinion/002a1edi



La Jornada, Jueves 15 de septiembre de 2016



Opinión
Lula, perseguido


El ex presidente brasileño Luis Inacioio Lula da Silva fue acusado ayer por la fiscalía de su país, en el marco de la investigación de sobornos en la empresa Petrobras, de propiedad estatal. La imputación presenta al mandatario como el máximo jefe de la trama de corrupción en la petrolera y lo señala por haber recibido comisiones ilegales de la empresa OAS. El paso siguiente es que el magistrado Sérgio Moro decida si el juicio es procedente, cosa que puede darse por segura, habida cuenta de que el juez es enemigo declarado de Lula.
 
Aunque las investigaciones en torno a las operaciones ilegales conocidas como Lava Jato han puesto fin a la carrera de varios políticos del ahora gobernante Partido del Movimiento Democrático Brasileño (PMDB), como el ex presidente de la Cámara de Diputados, Eduardo Cunha – principal impulsor de la destitución de Dilma Rousseff –, no debe pasarse por alto que es la dirigencia histórica del Partido de los Trabajadores (PT), y particularmente el ex mandatario ahora imputado, el objetivo prioritario del Poder Judicial.

Es significativo que la acusación ocurra días después de que Lula anunciara su intención de presentarse como candidato a las elecciones presidenciales de 2018, lo que otorga a la causa en contra del ex presidente un cariz político inocultable. A ello debe agregarse la poca verosimilitud de la imputación, que contrasta con el nivel de vida del viejo dirigente obrero, muy alejado del enriquecimiento súbito. En contraste, los numerosos integrantes de la clase política tradicional que han sido involucrados en el caso Lava Jato – el ejemplo más grotesco es el de Cunha – ostentan, por regla general, fortunas difícilmente explicables si no es por la corrupción.

En tales circunstancias, la crisis política que vive Brasil acaso deba ser vista como una operación en dos fases: una legislativa, que concluyó con la destitución de Dilma Rousseff, y una judicial, que ahora apunta contra su mentor y antecesor en el cargo. Tal sería, por principio de cuentas, la reacción de una oligarquía que sólo coyunturalmente toleró el ejercicio de la presidencia por un antiguo sindicalista metalúrgico y una luchadora social que participó en el movimiento guerrillero en contra de la dictadura militar en los años 60 del siglo pasado. Pero, más allá de esas animadversiones, es claro que el afán por destruir al gobierno del PT obedecía además al designio de cambiar el rumbo socioeconómico del poder público en la mayor nación de América Latina, suprimir los rasgos soberanistas y populares de la administración y operar una regresión hacia el neoliberalismo, tarea que ya realiza Michel Temer, el presidente impuesto tras la caída de Dilma.

Así pues, la acusación contra Lula parece confirmar que en Brasil se ha operado un golpe de Estado de cuello blanco y que, como ocurría tras los cuartelazos militares de antaño, ha comenzado ya la etapa de persecución de los derrotados.

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