Jornal do Brasil, 04/09/16
Dilma e a mulher adúltera
Dilma e a mulher adúltera
Por Siro Darlan*
Reconhecendo que o Brasil vive “momento triste”, o Papa pede que rezem pelo povo brasileiro. O Papa Francisco tem sido misericordioso com os brasileiros e como um bom “Hermano” tem sempre o Brasil em seu coração e em suas orações. Ele é o responsável pela mudança de rumo da Igreja que antes, muito romanizada, afastava-se do povo de Deus e hoje apresenta esse discurso inclusivo voltando às origens do cristianismo quando o Mestre, sem fazer qualquer distinção convidou a todos para a mesa da partilha do pão.
As escrituras contam que os fariseus, muito apegados à lei mosaica, para tentar a Jesus lhe apresentaram uma mulher adúltera, provocando-o: ”Esta mulher foi surpreendida em adultério; Moisés manda lapidar tais mulheres; mas que pensas tu”? Tratava-se de uma dupla armadilha: se houvesse mandado executá-la, logo perderia a fama da mansidão; mas, se houvesse mandado libertá-la, seria um violador da lei. Assim se pronunciou o Mestre da Misericórdia: “Quem se achar sem pecado, atire-lhe a primeira pedra.” Todos foram se retirando até que ficou apenas a mulher envergonhada e curada pelo amor e misericórdia de Jesus.
O noticiário recente também colocou uma mulher inocente no tribunal dos injustos, mas a história foi bem diferente. Num primeiro momento 367 deputados ofereceram a cabeça da vitima a seus parentes, apadrinhados, amantes e corréus e enviaram-na à “Corte de Pilatos” onde Judas se multiplicaram e 61 dos 81 juízes impuros apedrejaram-na com a Constituição nas mãos. Ora o leitor já imaginou um juiz corrupto julgando um acusado de corrupção? Ou um juiz pedófilo aplicando uma pena a um abusador de criança? Há um mínimo de isenção nesses magistrados? Ou, o que também ocorreu, pode uma ré ir a julgamento quando os seus juízes já anunciaram que iriam condená-la? O que diz a lei quando um juiz adianta seu julgamento? Fica impedido por falta da necessária e imprescindível isenção.
Nosso estado é laico, bem o sabemos, e não se deve confundir política com religião, mas há valores morais e religiosos que são comuns a todas as atividades, mormente as atividades públicas. Portanto não se pode admitir juízes venais, corrompidos e fundamentalistas. Os fatos devem ser objeto de apreciação para se fizer um juízo de valor e não as pessoas. Ao julgarem e condenarem uma mulher atribuindo-lhe crime que não cometeu, como muitos admitiram antes, durante e depois do julgamento, mas por fatos alheios ao julgamento como, por exemplo má administração, desemprego, volta da inflação, etc... está extrapolando o devido processo legal, que é a garantia de todos os cidadãos de serem julgados por um tribunal justo e isento.
*Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e membro da Associação Juízes para a democracia
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