quarta-feira, 21 de setembro de 2016

A Liga dos Convictos


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Carta Maior,  21/09/2016
 

A Liga dos Convictos



Por Pedro Tierra


O golpe-processo em curso no Brasil, desencadeado institucionalmente a partir da obscena votação de 17 de abril, de 2016, comandada por Eduardo Cunha na Câmara dos Deputados, busca consolidar-se. A partir da votação de 31 de agosto quando a presença de Dilma Rousseff no Plenário do Senado Federal, desnudou ante os olhos do país e do mundo a farsa criminosa do seu impedimento sem crime de responsabilidade, o Brasil passou a viver uma espécie de Regime Parlamentarista bastardo.

Ao não renunciar ao mandato que lhe foi outorgado pela vontade popular, como desejavam os porta-vozes das elites, Dilma abriu para a sociedade brasileira um novo espaço de consciência que recusa o tradicional e histórico “acordo por cima”. O “ jeitinho” oligárquico de perpetuação do mando. Retirou-se com a dignidade de quem alcançou a plena consciência do papel que lhe coube cumprir no desfecho desse enredo burlesco, condenada por um tribunal de velhacos, que associou o Senado Federal e o Presidente da Suprema Corte, despidos de pudor e de autoridade moral diante do país. Alvo de uma injustiça flagrante, reconhecida por toda a sociedade, saiu maior do que o Tribunal de Exceção que a condenou.

Temos a partir dali o país governado por um personagem que ninguém elegeu, que emergiu das sombras de uma conspiração ladeado por uma escória que inclui os derrotados nas urnas, nas últimas quatro eleições. O governo, fruto do atropelo da soberania popular, da fraude, da traição e da conspiração, vive neste momento o desafio de formular um discurso que seja convincente para a sociedade brasileira e para o mundo no plenário de abertura da Assembléia Geral das Nações Unidas, sobre “o normal funcionamento das instituições” no país.

Apesar do esforço concentrado dos seus sócios à frente do cartel da mídia familiar para “naturalizar” o golpe, a sociedade não dá sinais de absorver a mensagem emitida pelo governo usurpador. Segue sendo o que é: um governo golpista. Nem os governos de outros países, nem tampouco os mais relevantes meios de comunicação do mundo o percebem de outra forma. O governo golpista que se instalou no Brasil, amarga um severo isolamento. Leva o país à desmoralização e ao descrédito.

Um dos atores mais atuantes do golpe-processo, os setores do Ministério Público, que coordenam a Operação Lava-jato, sob a batuta do procurador Deltan Dallagnol promoveram um ato de molecagem contra o próprio Ministério Público como instituição e contra a sociedade brasileira, na tarde de 14 de setembro, ao montar um circo para denunciar o ex-Presidente Lula como o “Chefe do petrolão”, por lavagem de dinheiro e corrupção passiva. No “power point”  do menino de granja do Juiz Moro, sobrou convicção e faltaram provas. Uma peça irrigada pela ideologia do ódio de classe, contra os trabalhadores e os excluídos que Lula representa, subproduto do fascismo inoculado pelo discurso das classes dominantes no cérebro e no sangue de tipos como ele, rebento das classes médias abastadas, aterrorizadas com a ascensão social dos pobres.

A exposição do Coordenador da Lava-jato levantou uma caudalosa onda de indignação de diferentes setores da sociedade – aí incluídos os conservadores, na mídia como no Judiciário – e um constrangimento, como há muito não se via, nos meios jurídicos do país e do mundo, pela natureza do espetáculo, pela inconsistência e pela inépcia da denúncia apresentada à sociedade. Os meninos de granja do juiz Moro não acreditam na existência de vida inteligente fora do seleto círculo da Liga dos Convictos. Foram surpreendidos com o alcance da reação no sentido contrário ao objetivo que desejavam.

Para a Liga dos Convictos e seu porta-voz, Deltan Dallangnol, quando se trata de Lula, às favas com os ritos e com os procedimentos. Às favas com as provas. Não é demais lembrar o Ministro Jarbas Passarinho quando se preparava para assinar o AI-5: Ás favas com os escrúpulos. No caso presente, bastam as convicções. Seus antecessores no DOI-CODI do II Exército, nos anos 70, como o Cel. Carlos Alberto Brilhante Ustra, se utilizavam assiduamente de métodos semelhantes: os torturadores chegavam à sala de interrogatório com a tese do delito pronta. Tratava-se então de aplicar os métodos adequados para convencer o interrogado a confessar o crime que lhe imputavam...

Luiz Inácio Lula da Silva se tornou réu por ter praticado um crime intolerável, inafiançável e imprescritível: foi eleito democraticamente Presidente da República por duas vezes e elegeu sua sucessora Dilma Rousseff igualmente por duas vezes. Munidos, ele e ela, de um programa de combate às desigualdades sociais, proposto para uma das sociedades mais desiguais do planeta. E acolhido por maioria inquestionável. Produziram sob seu governo o mais importante deslocamento social ascendente da História do Brasil.

Tocaram aí num dogma irrevogável para as elites brasileiras, herdeiras do tráfico humano, da exploração do trabalho escravo e da propriedade latifundiária. Lula desafiou uma regra inscrita a fogo nas tábuas do costume, ao longo de uma trajetória de quinhentos anos: para os patriarcas da Casa Grande e para as classes médias brasileiras a ascensão na escala social de um indivíduo isoladamente é tolerada. Apenas tolerada. A ascensão de milhões de pessoas à condição de cidadãos e cidadãs que passam a disputar o orçamento público por meio das políticas de inclusão, que passam a disputar os espaços sociais – públicos e privados – como sujeitos portadores de direitos e de capacidade de consumo é um crime que deve ser punido com a execução política em praça pública. Com o esquartejamento moral segundo a tradição ibérica. Mais um pouco e alguém há de sugerir que se lance o sal sobre a terra onde ele nasceu. Para que não reste sinal de tamanha ousadia.

A passagem do PT e seus aliados pelo governo do Brasil, nos últimos 13 anos, expôs aos olhos do mundo a insensibilidade e a reação golpista de suas elites tradicionais a uma experiência de combate à fome e às desigualdades sociais e regionais por meio de políticas públicas. Os governos do PT expuseram a fratura social que historicamente nos caracteriza, apontaram e puseram em prática caminhos para sua superação. Sob esse ponto de vista é possível comparar a implacável campanha de perseguição a movida contra Lula e suas políticas de inclusão social, ao julgamento de Rivonia, em 1963, quando Nelson Mandela e seus companheiros foram condenados pelo regime do Apartheid na África do Sul. Lá acusados de sabotagem e terrorismo, quando, em verdade combatiam a discriminação racial. Aqui, acusado, sem prova, por corrupção e lavagem de dinheiro, quando na verdade combate a desigualdade social. O que se deseja com o golpe-processo é restaurar as políticas neoliberais derrotadas nas quatro últimas eleições. E restaurar as bases do Apartheid social que caracteriza nossa sociedade.

O golpe-processo em curso revela esse traço das elites brasileiras: não conseguem conviver com eleições livres. Depois da quarta derrota consecutiva, buscam, como fizeram no passado, retomar o controle do governo por meio do atalho, dessa vez pelo atalho do golpe parlamentar, com a cumplicidade do Judiciário e o apoio ensurdecedor do monopólio dos meios de comunicação. Ou seja, os mesmos atores sociais do Golpe anterior, ocorrido em 1964, excluídos os militares, cuja marca de arbítrio e violência por vinte anos ainda está fresca na memória da sociedade. E a serviço dos mesmos interesses econômicos: o capital financeiro, as grandes empresas transnacionais aí incluídas as empresas de petróleo que buscam pôr as mãos no pré-sal, a maior jazida encontrada no último século, graças à tecnologia de exploração de petróleo e gás em águas profundas, desenvolvida pela Petrobrás.

O objetivo é impedir um provável retorno de Lula ao governo nas eleições previstas para 2018. Para tanto movem uma campanha permanente para impedi-lo de participar como candidato a Presidente. O passo seguinte dessa estratégia será cassar o registro do Partido dos Trabalhadores, a exemplo do que ocorreu com o PCB no final dos anos 40, quando aquele partido adquiriu musculatura política e eleitoral suficiente para disputar os rumos da sociedade com os partidos oligárquicos.

As esquerdas brasileiras vivem um desafio: sitiadas pelo monopólio dos meios de comunicação, só excepcionalmente alcançam iludir o cerco imposto pela desinformação sistemática que alimenta a opinião publicada no país. A guerrilha eletrônica que cumpre o papel fundamental na batalha pela democracia, enfrenta limites severos para veicular informações até os cidadãos, na escala adequada numa sociedade contemporânea.

Quando ocorre o atentado ao Estado de Direito como o perpetrado por um bedel de seminário como Deltan Dalagnol, utilizando-se do aparelho do Ministério Público para promover o linchamento público da maior liderança popular do país, abre-se a estreita oportunidade para que Lula venha a público – porque não é possível escondê-lo – para oferecer as respostas aos ataques que vem sofrendo. E apenas isso. Para em seguida submergi-lo no silêncio.

A aceitação da denúncia pelo Juiz Moro é corolário natural desse processo que não se sustenta sobre os próprios pés à luz dos princípios e das regras do Estado de Direito. Manifesta-se assim o caráter de exceção com que o Judiciário brasileiro atua para afastar Lula do cenário político contribuindo assim para a inevitável radicalização dos conflitos sociais que se anuncia.



*Pedro Tierra (Hamilton Pereira) é poeta. Presidente do Conselho Curador da Fundação Perseu Abramo.

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Carta Maior, 20/09/2016



Todos são iguais perante a lei?



Por Redação





Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”.

A Constituição Brasileira também prevê o princípio da presunção de inocência no inciso LVII do mesmo artigo: "Ninguém será culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

Garante, ainda, habeas corpus, no inciso LXVIII: "conceder-se-á "habeas-corpus" sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder".

Isto posto, como explicar a notória seletividade da Justiça brasileira em investigações contra partidos e personalidades que atuam no campo da esquerda e a isenção de partidos e personalidades que atuam no campo da direita?

Trata-se de um flagrante desrespeito à Carta Maior, no caso, a carta constitucional brasileira.

A estratégia, todos conhecemos. Surge uma denúncia em um dos veículos do oligopólio midiático. Se for contra membros da base de apoio do governo de “plantão”, os anteriores, ela se torna instrumento de investigação e permanece durante semanas, meses, anos nas manchetes desses jornalões massacrando qualquer princípio de presunção de inocência.

O inverso é verdadeiro e se encaixa nas denúncias contra o governo de “plantão”, o atual, as notícias ganham as manchetes em um dia e somem no outro, sem qualquer investigação.

No que se refere às investigações da Polícia Federal, como visto em março de 2016, quando foi grampeada a própria presidência da República (G1, 16.03.2016), o que temos são abusos de autoridade inclusive reconhecidos pela Suprema Corte do país.

Um explícito abuso de poder.


Neste vale tudo, criam-se as condições para a ruptura da ordem institucional do país, chegando ao absurdo de levar ao poder um grupo de políticos contra os quais pesam seríssimas acusações.

O escárnio é mais um capítulo do espetáculo de violência na República brasileira, aplaudida por milhares de brasileiros manipulados, dia sim e no outro também, por uma máquina política ancorada na mídia, na corrupção política e em um modelo de judicialização nunca visto no país.
 

Segue abaixo uma lista de denúncias que saíram na imprensa brasileira envolvendo políticos intocáveis, até agora. Resta a pergunta: se “todos são iguais perante a lei”, quando o Supremo Tribunal Federal irá investigar essas pessoas?
 

Michel Temer: o presidente interino e golpista já foi citado por cinco delatores na Lava Jato e aparece em planilhas sob investigação da PF. Confiram as denúncias de Marcelo Odebrecht (OESP, 06.08.2016); Sérgio Machado ex-presidente da Transpetro, (G1, 15.06.2016); planilhas apreendidas de um executivo da Camargo Corrêa (OESP,08.12.2014); Júlio Camargo, ex-consultor da Toyo Setal, (OESP, 22.08.2015); Léo Pinheiro, presidente da OAS (FSP, 19.12.2015) e Delcídio do Amaral, (OESP, 15.03.2016).

José Serra: surge na delação de funcionários da Odebrecht e de Leo Pinheiro, ex-presidente da OAS (JB, 17.09.2016), (FSP, 07.08.2016), (Congresso em Foco, 24.03.2016). Denúncias de irregularidades em suas gestões no governo de São Paulo também aparecem (G1, 28.01.2016). As reportagens “Operação Abafa, como o tucanato se mantém no poder “(CM, 03.02.2016), A corrupção endêmica e o aparelhamento tucano em SP (CM, 16.02.2016) e “Tucano bom é tucano solto?” (CM,11.02.2016) reúnem várias dessas denúncias.

Eliseu Padilha: ministro-chefe da Casa Civil, surge nas delações de Delcídio do Amaral (OGLOBO, 25.04.2016), Marcelo Odebrecht (OESP, 06.08.2016), sendo réu em ação civil de improbidade administrativa (FSP, 17.05.2016).

Romero Jucá: citado na delação de Flávio Barros, ex-executivo da Andrade Gutierrez (OESP, 20.07.2016), de Nelson Mello, do Grupo Hypermarcas (OESP, 28.06.2016), de Paulo Roberto da Costa e Alexandre Yousseff (VALOR, 09.03.2016), de Delcídio do Amaral (OGLOBO, 09.03.2016) e Sérgio Machado (G1, 15.06.2016).

Governo FHC:
irregularidades da Era FHC surgiram nas delações de Pedro Barusco (OESP, 05.02.2015), Nestor Cerveró (OESP, 11.01.2016) e (OESP, 02.06.2016), e Delcídio do Amaral (El País, 03.05.2016). Confira as reportagens T”ucano bom é tucano solto? “(CM, 11.02.2016), A” sociologia da honestidade de FHC (CM, 13.01.2016) e  F”HC, o pior cabo eleitoral do país (CM,08.01.2016) com mais denúncias.”

Governo Alckmin: citado em um relatório da PF (OGLOBO, 26.03.2016), além de denúncias de irregularidades envolvendo doleiros da Lava Jato (VioMundo,18.12.2015). Confira as reportagens “Operação Abafa, como o tucanato se mantém no poder” (CM, 03.02.2016), “A corrupção endêmica e o aparelhamento tucano em SP” (CM, 16.02.2016) e “Tucano bom é tucano solto?” (CM,11.02.2016) que reúnem várias denúncias.

Eduardo Cunha: citado pelo ex-executivo da Toyo Setal, Júlio Camargo (OGLOBO, 16.07.2015), também por envolvimento na obra do Porto Maravilha, no Rio de Janeiro (OGLOBO, 16.12.2015), além de ser réu em duas ações penais no STF e uma denúncia sobre desvios do FGTS(OESP, 01.07.2016).

Moreira Franco: secretário do Programa de Parcerias de Investimentos do governo Temer, a primeira citação do homem bomba Eduardo Cunha por envolvimentona obra do Porto Maravilha, no Rio de Janeiro (UOL, 18.09.2016).

Sérgio Guerra - finado presidente do PSDB, citado nas delações de Yousseff e Paulo Roberto da Costa (EBC,25.08.2015).

José Sarney: citado por Sérgio Machado (G1,15.08.2016).

Renan Calheiros: alvo de nove inquéritos no escopo da Lava Jato (OESP, 03.05.2016). Citado porSérgio Machado (G1, 15.06.2016), Delcídio do Amaral (G1, 29.05.2016); Carlos Alexandre de Souza Rocha, o Ceará, (G1, 21.03.2016), Nestor Cerveró (OESP, 16.12.2015) e Fernando Baiano (OESP, 12.11.2015).

Aécio Neves: citado pelodoleiro Alberto Youssef (UOL, 25.08.2015); Carlos Alexandre de Souza Rocha, o Ceará, (OGLOBO, 30.12.2015); Fernando Moura (FSP, 03.02.2016); Delcídio do Amaral (OESP, 15.03.2016); Sérgio Machado ( (FSP, 15.06.2016) e Leo Pinheiro (RBA, 11.07.2016) e (FSP,27.08.2016). Confira também as reportagens Tucano bom é tucano solto? “(CM, 11.02.2016) e 14 escândalos de corrupção envolvendo Aécio, o PSDB e aliados” (CM, 17.10.2014).

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