segunda-feira, 29 de junho de 2015

Paul Krugman: "A Grécia deveria votar "não" às exigências da Troika"




http://www1.folha.uol.com.br/colunas/paulkrugman/2015/06/1649183-a-grecia-sobre-o-abismo.shtml



Folha.com, 29/06/2015


 

A Grécia sobre o abismo


 
Por Paul Krugman



É óbvio, há algum tempo, que a criação do euro foi um erro terrível. A Europa nunca teve as condições prévias para uma moeda única de sucesso.

Deixar uma união monetária é, no entanto, uma decisão muito mais difícil e mais assustadora do que nunca entrar nela, e, até agora, mesmo as economias mais problemáticas do continente têm recuado repetidamente da beira do abismo. Repetidas vezes, os governos têm se sujeitado às demandas dos credores por medidas de austeridade duras, enquanto o Banco Central Europeu administra a contenção do pânico do mercado.

Porém, a situação na Grécia atingiu agora o que parece ser um ponto sem retorno. Os bancos estão temporariamente fechados e o governo impôs controles de capital – limites para a movimentação de fundos para fora do país.

Parece altamente provável que o governo, em breve, tenha que começar a pagar pensões e salários em cupons, efetivamente criando uma moeda paralela. E na próxima semana o país vai realizar um referendo sobre se aceita ou não as exigências da "troika" – instituições que representam os interesses dos credores – de ainda mais austeridade.

A Grécia deveria votar "não", e o governo grego deve estar pronto, se necessário, para deixar o euro.

Para entender por que digo isso, é preciso perceber que a maioria – não tudo, mas a maioria – do que você já ouviu falar sobre a prodigalidade e irresponsabilidade grega é falsa. Sim, o governo estava gastando além das suas possibilidades, no final dos anos 2000, mas, desde então, tem repetidamente cortado gastos e aumentado impostos. Os empregos públicos caíram mais de 25%, e as pensões (que foram de fato generosas demais) foram cortadas drasticamente. Se você somar todas as medidas de austeridade, elas têm sido mais do que suficiente para eliminar o déficit original e transformá-lo em um grande excedente.

Então, por que isso não aconteceu? Porque a economia grega entrou em colapso, em grande parte, como resultado das medidas de austeridade, arrastando as receitas para baixo com elas.

E esse colapso, por sua vez, teve muito a ver com o euro, que prendeu a Grécia em uma camisa de força econômica. Casos de austeridade bem-sucedida, em que os países controlam os déficits sem entrar em uma depressão, normalmente envolvem grandes desvalorizações da moeda, que fazem suas exportações mais competitivas.

Isto foi o que aconteceu, por exemplo, no Canadá, na década de 1990, e até certo ponto foi o que aconteceu na Islândia, mais recentemente; mas a Grécia, sem a sua própria moeda, não teve essa opção.

Então, eu acabei de defender uma "Grexit" –saída da Grécia do euro? Não necessariamente. O problema de uma Grexit sempre foi o risco de caos financeiro, de um sistema bancário perturbado por saques em pânico e de negócios mancos tanto por problemas bancários quanto pela incerteza do status legal das dívidas. É por isso que sucessivos governos gregos aderiram às exigências de austeridade, e por isso, mesmo o Syriza, a coalizão de esquerda no poder, estava disposta a aceitar a austeridade que já tenha sido imposta. Tudo o que pediram foi, efetivamente, uma paralisação de mais austeridade.

Mas a troika não estava tendo nada disso. É fácil se perder nos detalhes, mas o ponto essencial agora é que tem sido apresentada à Grécia uma oferta que é "pegar ou largar", efetivamente indistinguível das políticas dos últimos cinco anos.

Esta é, e, presumivelmente, a intenção era ser, uma oferta que o primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, não pode aceitar, porque isso destruiria a sua razão política de ser. O objetivo deve ser, portanto, afastá-lo do cargo, o que provavelmente vai acontecer se os eleitores gregos temerem suficientemente o confronto com a troika para votar "sim" na próxima semana.

Mas eles não deveriam fazê-lo, por três razões. Em primeiro lugar, sabemos agora que a austeridade cada vez mais dura é um beco sem saída: após cinco, anos a Grécia está em pior forma do que nunca. Em segundo lugar, muito e talvez o mais temido do caos da Grexit já aconteceu. Com os bancos fechados e os controles de capital impostos, não há muitos danos mais a serem feitos.

Finalmente, a adesão ao ultimato da troika representaria o abandono definitivo de qualquer pretensão de independência grega. Não se deixe levar por alegações de que funcionários da Troika são apenas tecnocratas explicando aos gregos ignorantes o que deve ser feito. Estes tecnocratas supostamente são de fato fantasistas que têm ignorado tudo que sabemos sobre macroeconomia, e estiveram errados em cada passo do caminho. Não se trata de análise, mas de poder o poder dos credores de cortar as pernas da economia grega, que persiste enquanto a saída do euro é considerada impensável.

Então, é hora de pôr um fim ao que é impensável. Caso contrário, a Grécia terá de enfrentar uma austeridade sem fim e uma depressão sem nenhum indício de fim.


Tradução de Maria Paula Autran

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