segunda-feira, 8 de junho de 2015

Entre gangsters, esquerdistas e até roqueiros




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5 de junho de 2015


Entre gangsters, esquerdistas e até roqueiros

 
Por Paulo Moreira Leite
 
 
 
 
A hipótese de que nem todas as motivações do FBI para investigar a FIFA sejam legítimas nem louváveis não deve surpreender a ninguém. O FBI funciona como uma polícia secreta do governo norte-americano, funciona para servir seus interesses e tem um currículo nem sempre admirável.

Por exemplo: a investigação que deu origem a renuncia do presidente Richard Nixon, em 1974. teve um dirigente do FBI, Mark Felt, como a principal fonte dos repórteres Bob Woodward e Carl Bernestein, do Washington Post. Felt foi preterido na luta interna por promoções, ficou inconformado e decidiu vingar-se do governo Nixon. Suas análises e informações abriram o caminho para que as investigações chegassem ao Salão Oval da Casa Branca, o que levou Nixon a renúncia para evitar o impeachment.

Nós aprendemos a ter péssimas opiniões sobre Nixon, transformado em alvo predileto da juventude que se mobilizava contra o Vietnã. Mas a retaliação interna de autoridades policiais, que representam um poder armado, é sempre preocupante.

Imagine se em 1999, quando foi impedido de assumir a direção da Polícia Federal por uma questão da grande relevância — a denúncia de que se envolveu em torturas durante o regime militar — o delegado João Batista Campelo decidisse investigar — com ajuda da imprensa — o presidente Fernando Henrique Cardoso, responsável pela indicação e, mais tarde, pelo seu cancelamento.

Todas as proporções guardadas e as imensas distancias políticas e geográficas ocorridas, foi isso o que ocorreu.

John Edgard Hoover, que dirigiu o FBI entre 1935 e 1972, construiu um sistema de poder pessoal que lhe permitia intimidar autoridades diversas, inclusive aquelas eleitas pelo voto popular. Entrou na organização no início da década de 1930, com o país em depressão, dedicando-se a perseguir e prender lideranças operárias envolvidas na luta sindical. Também era responsável pela preparação de dossiês que permitiam expulsar lideranças estrangeiras.

Ao longo dos anos, acumulou tamanha força que transformou o FBI na maior polícia do planeta, com 16 000 funcionários. Pouco antes de Hoover deixar o posto, a organização possuía dados – inclusive impressões digitais — de 200 milhões de pessoas, o equivalente a 7% da população mundial na época.

Depois de perseguir líderes de trabalhadores, o FBI passou a ir atrás de políticos considerados inconvenientes pela direita norte-americana, da qual Hoover era uma força ativa e reconhecida. Nos últimos anos, espionava e bisbilhotava estrelas do cinema e do rock. Um filme biográfico sobre John Lennon revela as vergonhosas tentativas da instituição para impedir que o ex-Beatle conseguisse um visto permanente de residência nos EUA. O argumento nada tinha de criminoso ou coisa parecida. Sua base eram as ideias de Lennon, naquela época um autor de belíssimas canções de protesto.

Num movimento que acompanha a expansão militar dos Estados Unidos nos últimos anos, o FBI tem sido uma força auxiliar para transmitir a outros países opções de trabalho e linhas de atuação típicas do sistema judiciário norte-americano.

A partir de acordos bilaterais entre governos, em várias partes do mundo têm sido aprovadas legislações — anti-corrupção e antiterrorismo, por exemplo — que tem como base as leis em vigor nos Estados Unidos.

A organização costuma oferecer cursos de formação e treinamento à policiais e promotores de vários países do mundo — inclusive o Brasil — que assim aprendem a agir e atuar de acordo com métodos e tradições da justiça dos EUA.

Nos meios jurídicos, atribui-se a essa influencia o uso cada vez mais frequente de prisões preventivas na detenção de suspeitos — uma banalidade nos EUA, uma novidade em vários lugares, inclusive no Brasil. O mesmo ocorre com as delações premiadas.

A maioria dos brasileiros conhece o FBI dos seriados sobre mafiosos dos tempos da Lei Seca, que a televisão exibia já na década de 1960 — e que tem atualizado em versões que hoje dominam a TV a cabo.

A operação no futebol prendeu executivos da FIFA, cuja periculosidade dificilmente se pode negar. O histórico da organização e seu lugar essencial nas instituições do Estado norte-americano recomenda que se preste atenção aos interesses políticos e econômicos envolvidos.




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Caros Amigos, 08 de junho de 2015

Rede Globo mentiu sobre envolvimento da mídia no escândalo da FIFA



Por Antonio Lassance


A Rede Globo não apenas escondeu. Fez pior: mentiu deslavadamente ao dizer que a investigação do FBI sobre o esquema de propinas na FIFA não envolvia as empresas de mídia responsáveis pelas transmissões das copas do Mundo de Futebol.

O drible é facilmente revelado, primeiro, pelo próprio quadro produzido pelo FBI para explicar o fluxo de dinheiro embolsado pelos dirigentes da FIFA e das federações e confederações de futebol dos países.

O esquema, desenhado, mostra a relação íntima e escabrosa entre dirigentes das entidades do futebol, empresas de marketing esportivo, os grupos de transmissão televisiva e os patrocinadores.

Todos são não apenas suspeitos e, portanto, objeto da investigação que está em curso. Mais que isso, já existem grupos de mídia indiciados. O TyC Sports, canal de televisão argentino especializado em esportes, principalmente futebol, teve seu diretor executivo, Alejandro Burzaco, indiciado pela Justiça dos Estados Unidos, assim como Hugo Jinkis, presidente do grupo também argentino Full Play, que além de ser uma empresa que vende direitos de transmissão de eventos é uma empresa de mídia esportiva.

Outro exemplo é o paulista José Hawilla, dono da empresa Traffic, que tornou-se delator grampeando conversas para o FBI, desde 2013. Hawilla é dono de uma afiliada da TV Globo no interior de São Paulo, a TV Tem.

Por que a Globo esconde o jogo? Certamente porque é muito difícil explicar como a empresa pode estar isenta de qualquer relação com os escândalos sendo, desde décadas, a detentora da exclusividade nas transmissões das Copas do Mundo da FIFA, um dos veios privilegiados da corrupção revelada.

Por essas e por outras é que o jornalista Juca Kfouri diz, com razão, que o mundo das transmissões de futebol na TV pode ser mais sujo e pesado que o das empreiteiras.

Mas há ainda mais caroço nesse angu. A Globo também está interessada em ter a exclusividade de contar a muitos brasileiros, pela enésima vez, uma história que é um conto da Carochinha sobre escândalos. Uma ficção em que só há corruptos, mas não corruptores. Os vilões são os que receberam a propina, enquanto os que pagaram se fazem de vítimas.


A moral de uma história imoral
O mais importante de qualquer conto da Carochinha é a moral e o final da história. O "happy end" preferido pelas grandes corporações é aquele que já vimos em outros escândalos, qual seja, o de que elas seriam empresas grandes demais para quebrarem e caberem em uma prisão. No máximo, trocam-se os dirigentes, mas mantêm-se as práticas.

A única vítima disso tudo é o futebol, os torcedores e os países que recepcionam as copas. A parte do escândalo que envolve a FIFA não é exatamente futebol. É patrocínio esportivo, exclusividade das transmissões e lavagem de dinheiro.

Embora tenha seus próprios vilões, o escândalo da FIFA segue o mesmo script que envolve todo empreendimento capitalista em que a suposta concorrência do livre mercado não passa de uma fábula. Uma fábula que alguns contam, muitos acreditam, mas nunca vemos acontecer diante de nossos olhos do jeito que se fantasia.

Ao invés de mercado livre, as corporações criam esquemas monopolísticos ou cartelizados, premiando generosamente agentes públicos e privados que patrocinam seu direito de exploração comercial absoluta e predatória.

Qual a razão de haver propina, seja nesse caso ou de qualquer outro escândalo? A razão está em que o lucro a ser obtido é sempre muito maior do que o que se paga de propina, principalmente se o mercado for dominado por poucos. Não fosse assim, não haveria interesse no negócio azeitado pelas malas pretas.

Outro aspecto importante: o negócio que viabiliza a propina da FIFA não é o futebol, é a lavagem de dinheiro. A propina jamais vai direto para o bolso dos corruptos. Ela precisa ser lavada. O fato da sede da FIFA ser na Suíça não é mera coincidência e nada tem a ver com a qualidade de seus gramados.

Boicote a quem?
As investigações apontam que o contrato da Nike com a CBF rendeu a Ricardo Teixeira US$ 15 milhões em propina. Outros 15 teriam ido para Hawilla, o afiliado da Rede Globo. 

São parceiros da Fifa a Adidas, a Coca-Cola, a Budweiser (hoje de propriedade da Ambev, a mesma que patrocina a CBF com o Guaraná Antártica), o McDonald’s, a russa Gazprom, a Visa e a Kia-Hyundai. Todas estão sob suspeita.

A Rede McDonald’s, em 2014, renovou seu contrato anual de U$ 100 milhões por ano com a FIFA. Sua exclusividade vale até a copa de 2022. A Adidas tem contrato com a FIFA desde 1970 e, em 2014, renovou-o até 2030. Não se sabe o valor da parceria com a entidade, mas a empresa fatura cerca de US$2,7 bilhões por ano só no ramo do futebol.

O que fazer diante do escândalo que expõe as entranhas da cartolagem? A resposta mais óbvia é banir corruptos e corruptores. Joseph Blatter, Jérôme Valcke, Ricardo Teixeira e Jack Warner já estão com o nome sujo na praça. Mas e os corruptores? O que iremos fazer com eles? O FBI e a Suíça irão também prendê-los assim que seus CEOs passarem por Miami, Boca Ratón ou Genebra?

Nos Estados Unidos e no Reino Unido, se esboça uma ameaça de boicote à Copa na Rússia, por razões geopolíticas, e não éticas, muito menos esportivas. Mas é bom perguntar: o boicote à Rússia se estenderá também à Nike, à Coca-Cola, à Adidas, ao McDonald’s, à Budweiser? Se o Brasil for na mesma onda, que boicote oficial se fará à Ambev e à Rede Globo?

Pensando alto, se boicotarmos a Rússia, vamos trocá-la por quem? Pelos Estados Unidos, terra de Chuck Blazer, o megadirigente do futebol que era conhecido, no “país sério”, como “Mister 10%”? E quem vai entrar no lugar do Qatar? Que tal a França, de Jérome Valcke? Ou talvez a seríssima Suíça, terra natal de Joseph Blatter e dos bancos que são a maior lavanderia de dinheiro sujo do planeta?
Os corruptos da FIFA que foram para o banco dos réus têm um banco de reservas pronto para substituí-los. A FIFA, a CBF, a Concacaf e outras organizações são meros times. Claro que seria bom aproveitar o estrago provocado pelo escândalo para derrubar e substituir toda a cartolagem que controla o futebol.

Mais importante que mudar o time das federações e confederações de futebol seria mudar o jogo da sonegação de impostos e da lavagem de dinheiro que se abriga em paraísos fiscais e que se vale da livre circulação de capitais, sem a mínima regulação.

O que o FBI tem feito é pouco mais do que matar piolho com a unha. Faz barulho, arranca sangue e aplausos, mas não vai além disso, a não ser que acreditemos que, na terra da Disneylândia, os contos de fada realmente acontecem.

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