sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Oligarquia no estilo americano





Oligarquia no estilo americano


Paul Krugman

A desigualdade está de volta às notícias em parte graças ao movimento Ocuppy Wall Street, mas também com um pouco de ajuda do Escritório de Orçamento do Congresso (CBO). E sabemos o que isso significa: está na hora de trazer os ofuscadores! Do relatório CBO, estas são as mudanças, em pontos percentuais, da participação de renda de três grupos: o quinto mais alto, com exclusão do 1% mais alto – que é basicamente o lugar dos bem formados que não estão entre os mais sortudos – somente conseguiu manter o passo com o crescimento global de rendas. Praticamente toda redistribuição de renda aconteceu dos 80% mais baixos até os 1% mais altos (e sabemos que a maioria dela na verdade foi para os primeiros 0.1%).
Qualquer um que tenha lidado com essa questão sabe do que estou falando. Quando a crescente disparidade de rendas ameaça ficar em foco, um grupo de defensores tenta borrar a imagem novamente. Os think tanks produzem relatórios alegando que a desigualdade não está realmente aumentando, ou que ela não é importante. Especialistas tentam pintar um quadro mais ameno, alegando que na verdade não é uma questão de ricos contra os mais pobres, mas sim dos cultos contra os menos cultos.
Então o que você precisa saber é que essas alegações são basicamente tentativas de obscurecer a dura realidade: temos um sociedade na qual o dinheiro está cada vez mais concentrado nas mão de alguns poucos, e na qual essa concentração de renda e riquezas ameça transformar-nos em uma democracia somente no nome, e não de fato.

O Escritório de Orçamento apresentou um pouco dessa dura realidade em um relatório recente, documentando um declínio acentuado na participação de toda a renda por parte dos americanos de baixa e média-renda. Gostamos de pensar que os EUA é um país de classe média. Mas com 80% dos lares mais pobres agora recebendo menos do que metade da renda total, este é um modo de pensar que cada vez mais vai contra a realidade.
Como resposta, já apareceram algumas explicações bem conhecidas: os dados estão errados (não estão); os ricos são um grupo que muda constantemente (não é o caso); e assim por diante. No momento, a explicação mais popular parece ser aquela que diz que talvez não sejamos uma sociedade de classe média, na qual uma ampla classe de trabalhadores altamente bem qualificados, que possuem habilidades para competir no mundo moderno, está indo muito bem. Essa é uma boa estória, e muito menos perturbadora do que aquela em que uma nação na qual um grupo muito menor de pessoas ricas está ficando cada vez mais dominante. Mas ela não é verdadeira.

Trabalhadores com curso superior têm realmente, em média, ganhado melhor do que aqueles que não têm, e a distância entre eles tem aumentado ao longo do tempo. Mas americanos altamente qualificados não são imunes à estagnação da renda e da crescente insegurança econômica.

Os ganhos nos salários para a maioria dos trabalhadores com diploma universitário não tem sido grande (e não-existente desde 2000), enquanto que até mesmo os bem qualificados não tem mais garantias de conseguir empregos com benefícios. Em particular, nos dias de hoje, trabalhadores com diploma universitário, mas nenhum outro título, têm menos chances de conseguir planos de saúde pagos pelo trabalho do que trabalhadores que tinham somente o ensino médio completo em 1979.

Então, quem está tendo os grandes ganhos? Uma minoria muito rica e muito pequena.
O relatório do Escritório de Orçamento nos diz que praticamente toda redistribuição de renda para cima, que sai dos 80% mais pobres, tem ido para os americanos que fazem parte dos 1% mais ricos. Isto é, os manifestantes que se apresentam como representantes dos 99% estão basicamente certos, e os especialistas que os asseguram que a questão é relativa à educação e não aos ganhos da pequena elite, estão completamente errados.

Se há algo que os manifestantes estão fazendo errado é colocar o ponto de corte muito em baixo. O relatório recente do escritório de orçamento não analisa os 1% de cima, mas um relatório anterior que ia até 2005, descobriu que quase dois terços da crescente participação do percentual de cima de renda na verdade foi para os primeiros 0.1% - Os 1/1000 americanos mais ricos, cujas rendas cresceram mais de 400% entre 1979 e 2005.
Quem são esses americanos 0.1% mais ricos? São eles empresários heroicos criadores de empregos? Não, na sua maioria, são executivos de empresas. Uma pesquisa recente mostrou que cerca de 60% do topo 0.1% ou são executivos em companhias não-financeiras ou eles ganham seu dinheiro em finanças, i.e., Wall Street colocado de modo amplo. Adicione advogados e pessoas que trabalham no mercado imobiliário, e estamos falando de mais de 70% dos 1/1000 sortudos.

Mas por que esta crescente concentração de rendas e riquezas em poucas mãos importa? Parte da resposta está no fato de que a crescente desigualdade aponta para uma nação em que a maioria das famílias não participam plenamente no crescimento econômico. A outra parte da resposta está no fato de que uma vez que vemos o quanto rico ficaram os ricos, se torna mais atraente o argumento de que impostos mais altos para os que ganham mais deveria ser parte de um orçamento a longo prazo.

A resposta mais ampla, no entanto, é a de que a concentração extrema de renda é incompatível com a democracia real. Podemos seriamente negar que nosso sistema político tem sido distorcido pela influência do dinheiro, e que essa distorção está ficando pior na medida em que a riqueza dos poucos cresce cada vez mais?

Alguns especialistas tentarão dissipar as preocupações sobre a crescente desigualdade como sendo bobagem. Mas a verdade é que toda a natureza de nossa sociedade está em jogo.

Publicado originalmente no The New York Times

(*) Paul Krugman é professor de Economia e Assuntos Internacionais na Universidade de Princeton e um contribuinte frequente para o The New York Times. Krugmam recebeu em 2008 o Prêmio Nobel de Economia. Ele é autor de inúmeros livros, incluindo The Conscience of A Liberal, e o mais recente, The Return of Depression Economics.

Tradução: Márcio Larruscahim

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