Sábado, 05 de Novembro de 2011
Porto Alegre - Se na época das ditaduras militares na América Latina um dos grandes obstáculos para a liberdade era a censura estatal e sua proibição de divulgar informações de interesse público, hoje, nos países democráticos, o déficit do direito à informação se dá via outra forma de censura: a econômica. Na opinião de jornalistas brasileiros e estrangeiros, que participaram nesta quinta (3) de um seminário realizado no auditório da Associação de Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris), o chamado "quarto poder" é atualmente controlado hoje pelo poder econômico, a quem pouco ou nada interessa a construção e consolidação de sociedades democráticas.
Em sua exposição, o jornalista espanhol Pascual Serrano, fundador da publicação eletrônica Rebelión, analisou como, na democracia representativa e seu funcionamento a partir da expressão da opinião pública, os meios de comunicação privados, que formam esta opinião, acabam se tornando, na prática, interceptadores de informação. Serrano citou uma série de exemplos de como os princípios éticos do exercício jornalístico são incompatíveis na relação capital e meios de comunicação.
"Os grandes grupos de mídia se apresentam como baluartes da democracia, mas a eles não interessa a democracia ou a liberdade. Eles defenderão sempre, por exemplo, os interesses das grandes empresas e corporações que destróem o planeta, contanto que elas anunciem em suas páginas; vão promover os hospitais privados porque eles trazem mais dinheiro de publicidade do que a saúde pública, e assim por diante", descreveu.
Para o espanhol, os outros três Poderes também vivem ameaçados pelo econômico, que se tornou um ator fundamental da tomada de decisões em todo o mundo. No entanto, enquanto os três primeiros convivem com mecanismos clássicos de contraposição - como os partidos de oposição - a grande mídia, por conta da liberdade de imprensa, logra de impunidade aburda. "A oposição aos governos progressistas na América Latina hoje não são os partidos de direita, mas os meios de comunicação, que se tornaram atores políticos. Ninguém toca em seus privilégios, mesmo que sigam mentindo, caluniando e destruindo reputações", disse Pascual Serrano.
Para Breno Altmann, editor do Opera Mundi e diretor da Altercom (Associação Brasileira de Empresas e Empreendedores de Comunicação), a questão da mídia é um dos maiores problemas das democracias dos nossos tempos. "Os processos decisórios vão saindo dos espaços eletivos representativos e se ocultam em casamatas como os grandes meios, que exercem o processo da decisão política. É aí que a mídia desempenha um papel estruturante da hegemonia dos grandes grupos; se constitui no partido dessas elites financeiras. É pela mídia – mais do que pelas legendas partidárias – que se exerce o controle sobre sociedades cada vez mais priovadas de possibilidades. Como disse Antonio Gramsci nos anos 20, os jornais exercem uma atividade politica remunerada por laços de classe", afirmou.
Papel do Estado
Neste cenário, cabe ao Estado o dever de garantir pluralidade de vozes e opiniões no espaço jornalístico. Da mesma forma que uma instituição com fins lucrativos não terá o direito à educação como prioritário em seu funcionamento, não é dos meios privados que virá a garantia da liberdade de expressão do conjunto das sociedades. Daí a urgência, apontada pelos debatedores no seminário em Porto Alegre, do fortalecimento das mídias comunitárias e públicas.
"Sabemos que há maus precedentes de meios públicos que foram aproriados por governantes, impedindo a voz de setores opositores. Mas isso não deve impedir que defendamos essas mídias. Nos meios privados não temos sequer os mecanismos de participação democrática da população que podemos ter na mídia pública. É papel do Estado então fomentar essa participacão e diversidade. O mercado não vai nos prover da pluralidade de que precisamos", analisou Pascual Serrano.
No Brasil, no entanto, o desafio para que este papel de fato seja exercido se mostra enorme. Nos últimos governos, diante da pressão dos grandes grupos de comunicação para manter o controle da esfera midiática, os governos poucos avançaram rumo a uma democratização do setor.
"Lula governou durante oito anos e não fez um marco regulatório para as comunicações. Passou sete anos e onze meses com medo da Globo e, no último mês de governo, pediu para o ministro Franklin Martins escrever um projeto. Agora, temos o ministro Paulo Bernardo, que sequer chega perto do controle remoto para não correr o risco de tirar da Globo", criticou o jornalista Paulo Henrique Amorim, do site Conversa Afiada.
Na última semana, como informou a Carta Maior, o ministro Bernardo decidiu que abrirá uma consulta pública sobre o novo marco regulatório somente no começo de 2012. Para o ministério, o final do ano não seria adequado porque esta é uma época em que muita gente sai de férias ou de recesso.
"Se este ano temos o Natal, em 2012 teremos Carnaval, Semana Santa e eleição municipal. Se formos seguir esta lógica, não haverá uma nova lei de meios no Brasil", acrescentou Amorim. "O problema é que o governo Dilma tem uma visão "temo-tecnecista" da mídia: teme a Globo e acha que a banda larga vai promover a democracia. É como acreditar que o vaso vai determinar a qualidade do vinho. Esta é a teoria que está embasando a posição do governo", acrescentou.
Na opinião do jornalista Breno Altmann, ou a questão da democratização das comunicações se resolve pela ação do Estado ou nunca vai se resolver. "Nas mãos do mercado, a tendência será sempre a da monopolização, como acontece com vários outros setores. Mas há uma enorme covardia dos governos; não se toma medidas para enfrentar o tema com medo da retaliação da mídia. Se este clima não for invertido, a mudança nunca será concretizada". Que Brasília os ouça.
Jornalistas defendem ação do Estado para garantia de pluralidade na mídia
Para profissionais brasileiros e estrangeiros, os meios de comunicação privados são regidos pelo interesse das grandes empresas e não estão preocupados em garantir a pluralidade e diversidade no jornalismo. Se o Estado não deixar de se acovardar, nunca a democratização da mídia será concretizada no Brasil, acreditam. "O mercado não vai nos prover da pluralidade de que precisamos", diz o jornalista espanhol Pascual Serrano.
Bia Barbosa
Porto Alegre - Se na época das ditaduras militares na América Latina um dos grandes obstáculos para a liberdade era a censura estatal e sua proibição de divulgar informações de interesse público, hoje, nos países democráticos, o déficit do direito à informação se dá via outra forma de censura: a econômica. Na opinião de jornalistas brasileiros e estrangeiros, que participaram nesta quinta (3) de um seminário realizado no auditório da Associação de Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris), o chamado "quarto poder" é atualmente controlado hoje pelo poder econômico, a quem pouco ou nada interessa a construção e consolidação de sociedades democráticas.
Em sua exposição, o jornalista espanhol Pascual Serrano, fundador da publicação eletrônica Rebelión, analisou como, na democracia representativa e seu funcionamento a partir da expressão da opinião pública, os meios de comunicação privados, que formam esta opinião, acabam se tornando, na prática, interceptadores de informação. Serrano citou uma série de exemplos de como os princípios éticos do exercício jornalístico são incompatíveis na relação capital e meios de comunicação.
"Os grandes grupos de mídia se apresentam como baluartes da democracia, mas a eles não interessa a democracia ou a liberdade. Eles defenderão sempre, por exemplo, os interesses das grandes empresas e corporações que destróem o planeta, contanto que elas anunciem em suas páginas; vão promover os hospitais privados porque eles trazem mais dinheiro de publicidade do que a saúde pública, e assim por diante", descreveu.
Para o espanhol, os outros três Poderes também vivem ameaçados pelo econômico, que se tornou um ator fundamental da tomada de decisões em todo o mundo. No entanto, enquanto os três primeiros convivem com mecanismos clássicos de contraposição - como os partidos de oposição - a grande mídia, por conta da liberdade de imprensa, logra de impunidade aburda. "A oposição aos governos progressistas na América Latina hoje não são os partidos de direita, mas os meios de comunicação, que se tornaram atores políticos. Ninguém toca em seus privilégios, mesmo que sigam mentindo, caluniando e destruindo reputações", disse Pascual Serrano.
Para Breno Altmann, editor do Opera Mundi e diretor da Altercom (Associação Brasileira de Empresas e Empreendedores de Comunicação), a questão da mídia é um dos maiores problemas das democracias dos nossos tempos. "Os processos decisórios vão saindo dos espaços eletivos representativos e se ocultam em casamatas como os grandes meios, que exercem o processo da decisão política. É aí que a mídia desempenha um papel estruturante da hegemonia dos grandes grupos; se constitui no partido dessas elites financeiras. É pela mídia – mais do que pelas legendas partidárias – que se exerce o controle sobre sociedades cada vez mais priovadas de possibilidades. Como disse Antonio Gramsci nos anos 20, os jornais exercem uma atividade politica remunerada por laços de classe", afirmou.
Papel do Estado
Neste cenário, cabe ao Estado o dever de garantir pluralidade de vozes e opiniões no espaço jornalístico. Da mesma forma que uma instituição com fins lucrativos não terá o direito à educação como prioritário em seu funcionamento, não é dos meios privados que virá a garantia da liberdade de expressão do conjunto das sociedades. Daí a urgência, apontada pelos debatedores no seminário em Porto Alegre, do fortalecimento das mídias comunitárias e públicas.
"Sabemos que há maus precedentes de meios públicos que foram aproriados por governantes, impedindo a voz de setores opositores. Mas isso não deve impedir que defendamos essas mídias. Nos meios privados não temos sequer os mecanismos de participação democrática da população que podemos ter na mídia pública. É papel do Estado então fomentar essa participacão e diversidade. O mercado não vai nos prover da pluralidade de que precisamos", analisou Pascual Serrano.
No Brasil, no entanto, o desafio para que este papel de fato seja exercido se mostra enorme. Nos últimos governos, diante da pressão dos grandes grupos de comunicação para manter o controle da esfera midiática, os governos poucos avançaram rumo a uma democratização do setor.
"Lula governou durante oito anos e não fez um marco regulatório para as comunicações. Passou sete anos e onze meses com medo da Globo e, no último mês de governo, pediu para o ministro Franklin Martins escrever um projeto. Agora, temos o ministro Paulo Bernardo, que sequer chega perto do controle remoto para não correr o risco de tirar da Globo", criticou o jornalista Paulo Henrique Amorim, do site Conversa Afiada.
Na última semana, como informou a Carta Maior, o ministro Bernardo decidiu que abrirá uma consulta pública sobre o novo marco regulatório somente no começo de 2012. Para o ministério, o final do ano não seria adequado porque esta é uma época em que muita gente sai de férias ou de recesso.
"Se este ano temos o Natal, em 2012 teremos Carnaval, Semana Santa e eleição municipal. Se formos seguir esta lógica, não haverá uma nova lei de meios no Brasil", acrescentou Amorim. "O problema é que o governo Dilma tem uma visão "temo-tecnecista" da mídia: teme a Globo e acha que a banda larga vai promover a democracia. É como acreditar que o vaso vai determinar a qualidade do vinho. Esta é a teoria que está embasando a posição do governo", acrescentou.
Na opinião do jornalista Breno Altmann, ou a questão da democratização das comunicações se resolve pela ação do Estado ou nunca vai se resolver. "Nas mãos do mercado, a tendência será sempre a da monopolização, como acontece com vários outros setores. Mas há uma enorme covardia dos governos; não se toma medidas para enfrentar o tema com medo da retaliação da mídia. Se este clima não for invertido, a mudança nunca será concretizada". Que Brasília os ouça.
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