CartaCapital, 03/06/16
Editorial
O Judiciário manda
Por Mino Carta
O Poder Judiciário ergue o tom de voz, pretende mostrar a que veio e aonde quer chegar no mesmo momento em que o poder parlamentar, em cujas sedes o golpe progrediu até o afastamento de Dilma Rousseff, complica-se com as gravações de Sérgio Machado e as reações ao pacote do ministro Meirelles. Sem contar a ameaça iminente das delações da Odebrecht e de Machado Júnior.
E aí se encaixa o indiciamento do presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, e de mais dois altos executivos da instituição, e outros seis cidadãos pretensamente envolvidos em uma trama criminosa.
O caso do Bradesco é exemplar da situação em que o golpe em marcha mergulha o País. O banco tem uma tradição digna e sempre foi válido suporte da indústria brasileira. Este enredo mostra que no Brasil os corruptos levam a melhor contra quem não se deixa corromper.
Os fiscais nativos não são flores de orquidário, isto é do conhecimento até do mundo mineral. Desta feita, decidiram achacar o Bradesco por razões que não excluem a chantagem, a ponto de se prontificarem a sugerir a entrada em cena de certo grupo de lobistas, capacitados a encontrar uma solução favorável a todos, com exceção do próprio Fisco e do cofre do Estado.
O Bradesco rejeitou a sugestão, mas os fiscais voltaram à carga: exigiam uma multa de 3 bilhões de reais. O banco propôs um acordo ao Carf, foi negado por 6 a 0.
Ao contrário do alegado pelo indiciamento da Polícia Federal, habilitada a tanto pelo Ministério Público, Trabuco nunca participou de encontros com os lobistas, tampouco se dispôs a usar-lhes os préstimos.
Inclino-me a crer que incomodam togas e polícia as boas relações que o presidente do Bradesco mantém com Luiz Inácio Lula da Silva. Foi quem, aliás, sugeriu a Dilma, logo após a reeleição, chamar Trabuco para o Ministério da Fazenda.
Há mais a exibir o açodamento do Poder Judiciário, que hoje substitui os tanques de outrora pelas indômitas e obedientes coortes da Polícia Federal. Assume a ribalta o costumeiro Sergio Moro, que se nega a selar acordo de delação com Leo Pinheiro, presidente da OAS.
Por quê? Simples, simples demais. Porque Pinheiro insiste em inocentar Lula nos casos da reforma do fantasmagórico triplex na praia dos farofeiros e do sítio de Atibaia cercado pela favela. Cabe, desta vez, invocar até a memória do mundo mineral: o ex-presidente preferiu não ficar com o triplex e a OAS poderá vendê-lo a quem se dispuser a passar seus fins de semana em meio a piqueniques na areia.
Quanto ao sítio, não há cartório em que se prove ser propriedade dos Lula da Silva, e Pinheiro tem todo o direito de afirmar que a reforma, de pouca monta, foi presente de amigo.
Fatos deste naipe afirmam a força de que se sente investido o Poder Judiciário, e, no comando da política brasileira, o juiz curitibano. Consta que, ciente dos riscos a cercá-lo, o presidente interino Michel Temer se prepara a tecer loas à Lava Jato no seu próximo discurso, para reparar os estragos provocados pelos grampos de Sérgio Machado, de gravador escondido no bolso do paletó.
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