Brasil 247, 28/06/16
A falta de pudor de Temer
Por Tereza Cruvinel
A propósito das demissões de
integrantes do Conselho Nacional de Educação, o ex-ministro da pasta,
Aloizio Mercadante, foi preciso ao definir a falta de cerimônia com que o
vice presidente em exercício Michel Temer avança o sinal, atropela lei e
as regras de funcionamento das instituições públicas. ”Mais uma vez
este governo demonstra incapacidade de distinguir entre instituições de
Estado e interesses de governo", diz Mercadante. Os 24 conselheiros,
nomeados por Dilma, estavam no exercício dos mandatos previstos em lei e
no regimento do CNE.
A esta violação some-se a
intervenção na EBC, condenada até pela ONU, e a destituição de seu
presidente mandatado, Ricardo Melo, revertida provisoriamente por
liminar do ministro Dias Toffoli, do STF. Enquanto o mérito não é
julgado a empresa de comunicação pública vive o inferno da incerteza,
alimentado por notícias de que Temer vai acabar com tudo, ora só com a
TV Brasil, ora vai transformar a estrutura arduamente construída em uma
agência de notícias. É muito pensar pequeno, é muito ignorar o valor
universal e internacional da comunicação pública nas democracias.
Na semana passada, outra
ilegalidade. Temer demitiu o presidente da Agência Nacional de
Assistência Técnica e Extensão Rural (ANATER), que também tinha mandato
de quatro anos garantido em lei. Mas foi nomeado por Dilma, que até onde
se sabe ainda é presidente da República, então que seja degolado. A
ANATER é entidade de direito privado em colaboração com o Poder Público
na execução das políticas de assistência técnica e extensão rural aos
agricultores familiares. Não possui qualquer vínculo de subordinação
hierárquica a qualquer ministério ou instância do Poder Executivo. Tal
como o presidente da EBC, é nomeado pelo presidente da República mas seu
mandato tem que ser respeitado, salvo nos casos previstos em lei.
Dane-se a lei.
Da mesma forma, a independência dos
24 conselheiros do CNE é garantida por mandatos de quatro anos. Em
abril, ainda ministro, Mercadante publicou a lista das 39 entidades
civis de educação que haviam feito indicações. Dilma fez as indicações a
partir da lista de indicados, embora pudesse sacar do bolso metade dos
conselheiros. Por terem sido nomeados por ela, estão sendo todos
exonerados, apesar do mandato. Dane-se o regimento do CNE.
O governo vem demitindo uma média de
100 funcionários por dia, nos mais altos e nos mais baixos escalões,
embora Temer por ora seja apenas um vice no exercício do cargo. Nos
altos escalões, demite-se para nomear pessoas afinadas com as novas
políticas de governo, e demite-se também por mera caça às bruxas, porque
o funcionário tem laços com o PT ou partidos da base de Dilma.
Daqui a pouco, Temer vai demitir os
presidentes das agências reguladoras. Quando isso acontecer, será melhor
fechá-las. Quando deixarem de ser independentes, não terão mais
qualquer serventia como reguladoras do mercado e defensoras dos usuários
e clientes de serviços públicos, executados diretamente pelo Estado ou
concessionados.
E preparem-se os procuradores, pois
neste ritmo, dificilmente Temer fará como Lula e Dilma, que sempre
escolheram o Procurador-Geral a partir da lista tríplice eleita pelos
próprios integrantes da carreira. O MPF, órgão de Estado, nesta marcha
também acabará sendo visto como organismo governamental.
http://www1.folha.uol.com.br/ colunas/janiodefreitas/2016/ 06/1787079-ponto-de-encontro. shtml
Folha.com, 30/06/16
Ponto de encontro
Por Janio de Freitas
Michel Temer e seu governo agem para salvar Eduardo Cunha na Câmara.
Talvez não fosse preciso dizer mais nada sobre a atitude de Temer.
Afinal, apesar de todo o esforço da Lava Jato e dos pró-impeachment para
incriminar petistas, na opinião nacional ninguém simboliza mais a
calamidade política do que Eduardo Cunha. Está dito quase tudo sobre
protetor e protegido. Mas Temer leva a algumas observações adicionais.
Descoberto por jornalistas o encontro sorrateiro de Cunha e Temer na noite de domingo (26), o primeiro fez o que mais faz: negou. Não falava com Temer desde a semana anterior. Com a mentira, comprovou que a combinação era de encontro oculto. O segundo deu esta explicação: "Converso com todo mundo. Embora afastado, ele é um deputado no exercício do seu mandato".
A frase é uma medida da lucidez de Temer ou da honestidade de sua resposta ao flagrante: "afastado" mas "no exercício do mandato". Nada de muito novo. Mas a pretensa justificativa de que "conversa com todo mundo" excede o aspecto pessoal. Se é isso mesmo, em quase seis anos de convívio com o Poder ainda não o compreendeu. À parte a liturgia do cargo, de que Sarney tanto falou, o Poder requer cuidados com sua respeitabilidade. Ao menos no sentido, tão do agrado de jornalistas brasileiros, cobrado às aparências da mulher de César.
O sítio de alto luxo não combina, mas não tira o título do Palácio do Jaburu, nem, muito menos, a sua condição de uma das sedes do mais alto poder governamental. O recepcionado aí para a barganha de espertezas não é, porém, como "todo mundo". É um múltiplo réu no Supremo Tribunal Federal, tão excluído do exercício de mandato que está proibido até de simplesmente entrar na Câmara dos Deputados, Casa aberta a todos. Proibição, ao que consta, sem precedente. Não no conceito, de moralidade ao menos duvidosa, que o atual morador aplica ao uso do palácio de governo.
Eduardo Cunha viu-se necessitado de reforço em duas instâncias. Na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, à qual encaminhou recurso contra a decisão do Conselho de Ética, que o considerou passível de perda do mandato. E também na substituição de Waldir Maranhão, em exercício na presidência da Casa, por alguém de sua confiança, para assegurar-lhe decisões favoráveis nas manobras de defesa ao ser julgado em plenário.
Já na segunda-feira (27), Temer fazia iniciar a ação do seu pessoal em favor da eleição de Rogério Rosso para presidir a Câmara. É o preferido por Eduardo Cunha. E viva a nova (i)moralidade.
Das "homenagens" prestadas
POR DENTRO DO FORA
A ordem de Michel Temer para suspender a cobertura oficial de sua presença fora de Brasília não é, como alegado, para reduzir gastos. É nenhum o custo de um fotógrafo ou cameraman já integrante da comunicação oficial. O problema está na impossibilidade de eliminar, nas gravações, o frequente "Fora, Temer", dito ou escrito. Sem encontrar outra solução, foi considerado preferível eliminar os registros.
Apesar de imprensa e TV não o noticiarem, coros de "Fora, Temer" estão pelo país todo. No espetáculo do Prêmio da Música Brasileira, por exemplo, o Teatro Municipal do Rio explodiu em repentino "Fora, Temer". Coisas assim acontecem todos os dias, numerosas.
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