domingo, 23 de março de 2014

Abominável silêncio sobre José Dirceu




Brasil 247, 23/03/2014



Abominável silêncio sobre José Dirceu


Por Breno Altman




Um espectro ronda a vida institucional e jurídica do país, movimentando-se na calada da sociedade e do Estado.  Seus  contornos podem ser definidos por uma pergunta: a democracia comporta o linchamento midiático e processual como ferramenta para eliminar inimigos políticos?
A questão leva nome e sobrenome. Há mais de quatro meses o ex-ministro José Dirceu de Oliveira e Silva cumpre pena em regime fechado, mesmo tendo sido condenado ao cumprimento inicial em sistema semiaberto. O presidente do STF, com a cumplicidade do juiz encarregado da execução penal, pisoteia ou posterga decisões da própria corte.
Não importa, a esses senhores e seus aliados, que a essência da acusação contra o líder petista tenha sido esvaziada pela absolvição acerca da formação de quadrilha. Afinal, sentenciado sem provas materiais ou testemunhais, Dirceu teve sua culpa determinada por uma teoria que considerava suficiente a função que eventualmente exercera no comando de suposto bando criminoso, cuja existência não é mais reconhecida.
O grupo chefiado pelo ministro Joaquim Barbosa, no entanto, resolveu virar as costas para a soberania da instituição que preside. Sob pretexto de regalias e privilégios que jamais se comprovam, mas emergem como verdadeiros nas páginas de jornais e revistas, a José Dirceu se nega o mais comezinho dos direitos. Permanece preso de forma ilegal, dia após dia, em processo no qual a justiça se vê substituída pela vingança.
Há poucos paralelos na história posterior à redemocratização, revelando o poderio dos setores mais conservadores e autoritários quase três décadas depois de findada a ditadura dos generais. As irregularidades contra Dirceu, acima de problema humanitário, afetam pilares fundamentais do regime democrático e civilizado.
O mais triste e preocupante, porém, é a omissão do mundo político diante da barbaridade. Vozes representativas do Estado e da sociedade fazem opção pela abulia e a passividade, possivelmente, e de antemão, atemorizadas pela reação de alguns veículos de comunicação e o dano de imagem que poderiam provocar contra quem ousasse dissentir.
O protesto cresce entre cidadãos e ativistas, alcança o universo jurídico, recebe acolhida de alguns articulistas e chega a provocar certo nível de resposta nos partidos e organizações progressistas. Mas a ilegalidade, respaldada por boa parte da mídia tradicional, não é enfrentada à altura por autoridades governamentais e entidades cujo papel obrigatório na defesa dos direitos democráticos deveria impor outro comportamento.
O mutismo refugia-se em álibis como a independência entre poderes e o caráter terminal da sentença promulgada pelo STF. Como se o bem supremo a ser defendido não fosse a Constituição, mas o respeito ritualístico a uma instância na qual se formou maioria transitória a favor do arbítrio.
Outra camuflagem aparece sob a forma de abordagem unilateral ao que vem a ser liberdade de imprensa. Como se empresas jornalísticas estivessem acima das normas e do escrutínio da cidadania. Ou é aceitável que responsáveis pela coisa pública abdiquem da crítica frontal quando meios de comunicação violam conduta para destruir reputações e prerrogativas inscritas em lei?
Estes são, enfim, temas da democracia, não apenas da solidariedade a José Dirceu ou da jurisdição de petistas que lhe são leais. O silêncio sobre o caso é tão abominável quanto aquele que, no passado, franqueou decisões do STF entregando Olga Benário ao nazismo ou chancelando o golpe militar de 1964.

Breno Altman, 52, é diretor editorial do site Opera Mundi.
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DCM, 21/03/2014



O que explica a ação retardada de JB contra Noblat?



Por Paulo Nogueira

 

A conhecida morosidade da justiça se manifestou mais uma vez no movimento de Joaquim Barbosa contra o jornalista Ricardo Noblat.
Foi uma ação retardada.
Passaram-se sete meses desde que Noblat escreveu, no Globo, um artigo que JB considerou racista e nocivo à sua honra.
No artigo, para muitos um dos raros acertos de Noblat, está dito que JB chegou ao STF por sua cor.

Esta é uma verdade.
Frei Betto já contou o que ocorreu. Lula queria um negro no STF. JB sabia, e um dia viu Betto no aeroporto de Brasília e o abordou.
O resto é história.
Noblat afirmou que JB não é exatamente uma sumidade jurídica. Os especialistas podem falar disso com mais propriedade.
Para nós, leigos, o palavreado titubeante e pouco claro de JB sugere que Noblat está certo – embora os demais magníficos integrantes do STF, salvo exceções, também não provoquem entusiasmo e muito menos admiração.
A coisa que melhor os define me foi contada por um amigo jornalista. Ele estava numa padaria, ao lado de populares que acompanhavam o julgamento do Mensalão.
Um juiz falou, e falou, e falou, e enfim votou. No final, um dos homens que viam o julgamento na padaria perguntou aos que o rodeavam: “Condenou ou absolveu?”
De concreto, o que se sabe é que JB não tem obra relevante sobre direito – nem livros e nem artigos que sejam citados e reconhecidos.
A parte mais complicada do artigo de Noblat diz respeito à raça.
Minha visão é que, por não ser branco, Noblat se permitiu falar coisas que em geral ninguém quer falar.
É mais ou menos como piada de judeu. Só aceitamos que judeus as contem, ou ficamos horrorizados com o que entendemos ser preconceito.
Noblat afirmou que certos negros, em posição de mando, são mais duros do que seria necessário, para se afirmarem.
Não tenho a menor ideia sobre se esta tese faz sentido, mas suspeito que não. Joaquim Barbosa não faz nada que colegas seus brancos como Gilmar Mendes não façam.
A mim, pessoalmente, me parece um mau juiz, pelo instinto de algoz, mas isso nada tem a ver com a cor.
O que a iniciativa tardia de Joaquim Barbosa pode revelar é o fim da lua de mel dele com as Organizações Globo.
Dias atrás, circulou na internet uma foto na qual JB dormia profundamente numa sessão de um órgão que não era o STF.
O que se dizia era que tinha sido publicada pelo Globo, com a informação de que JB recebia jetom pela participação na reunião.
JB teria se vingado?
Noblat não é a Globo, mas é o nome da Globo mais vinculado a uma área estratégica para o futuro (ameaçado) da emissora: a internet.
Isso explicaria a ação retardada?
Talvez sim, talvez não.
O fato é que JB, no final de sua jornada como presidente do STF, já percebeu que nos últimos meses até o cafezinho que servem a quem se vai está frio.
O “menino pobre que mudou o Brasil”, como escreveu a Veja no auge de sua bajulação interessada, não vingou.
Não virou um novo Collor, não virou um anti-Lula e nem mesmo um anti-Dilma.
Não virou nada, na verdade.
Voltou a ser o que era antes do encontro com Frei Betto no aeroporto, com a diferença de que parece ter ficado encantado com os holofotes que vão sumindo.

O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo

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