sábado, 26 de setembro de 2015

Em defesa da aviação nacional

 http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/234369-em-defesa-da-aviacao-nacional.shtml



Folha.com, 26/09/2015

Em defesa da aviação nacional


Por José Adriano Castanho Ferreira
 
Existem vários projetos de lei no Congresso que tratam da participação do capital internacional nas empresas aéreas brasileiras, porém dois deles se destacam pelo absurdo de propor a abertura total e irrestrita, permitindo que as companhias sejam 100% controladas por estrangeiros, sem que haja nenhum estudo de impacto ou análise de risco.
 
São os Projetos de Lei do Senado nº 2/15 e o nº 330/15, ambos em pauta na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) daquela Casa.
Os maiores mercados do mundo mantêm controle sobre sua aviação. Nos Estados Unidos, por exemplo, o limite para participação de capital estrangeiro nas companhias locais é de 25%. Nos países da União Europeia, esse índice é de 49%. O Brasil, que hoje possui o quarto maior mercado mundial de aviação, tem limite de 20%.
 
Defender esse mercado é estratégico para o país, já que todas as previsões apontam para um crescimento ainda maior do setor –será o terceiro maior do planeta em 2017, segundo projeção da Associação Internacional de Transporte Aéreo.
 
Nada justifica entregarmos esse mercado a estrangeiros, correndo risco de um impacto direto nos empregos e de um escoamento bilionário de divisas para o exterior. O mercado 100% aberto ao capital estrangeiro tende ao monopólio, causado pela concorrência predatória entre as gigantes do exterior e as empresas domésticas, que acabam sendo compradas pelas mais fortes ou indo à falência.
 
O governo não possui controle sobre empresas dominadas por capital estrangeiro para forçar a operação por interesses sociais e para locais isolados ou de pouca demanda. Dessa forma, perde a economia local e perdem os usuários do transporte aéreo, com oferta de voos limitada por interesses econômicos.

Além disso, as estrangeiras passariam a ditar as tarifas, colocando a população à mercê de um mercado fora do controle nacional.
 
A experiência de países que adotaram esse modelo mostra impactos desastrosos. Como um exemplo claro é possível citar o caso da companhia Aerolíneas Argentinas, que teve 85% de seu capital adquirido pela espanhola Iberia.

Após uma diminuição drástica das rotas e sucateamento das aeronaves, a companhia foi reestatizada, em um processo que custou milhões de dólares ao governo argentino. Poucos países tiveram sucesso com esse modelo de abertura –
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nenhum com posicionamento geográfico privilegiado e com dimensões continentais como o nosso.
A pergunta que devemos fazer é esta: a quem poderia interessar a abertura total e irrestrita do capital no Brasil? Hoje, temos quatro empresas aéreas de grande porte no país e todas já possuem alguma participação de capital estrangeiro.

Vários outros projetos já tratam de alguma forma da abertura dos céus no Brasil, tanto no Legislativo como no Executivo e agências de regulação – acordos bilaterais, fusão de marcas, intercâmbio de aeronaves e liberdade de licenças e de matrículas. Nenhum desses projetos, porém, está sendo considerado na discussão dos projetos de lei que tratam da abertura do capital.
 
A aprovação de uma lei nesse sentido, somada a todos esses fatores, poderá resultar na instituição da cabotagem camuflada no país, similar ao que ocorre no sistema marítimo (marinha mercante), em que empresas estrangeiras ditam as regras de todo o transporte de grande porte realizado aqui.

O que o Brasil precisa é decidir se está disposto a entregar também a sua aviação. Precisa definir também se o fará por falta de competência ou por alguns interesses escusos.


JOSÉ ADRIANO CASTANHO FERREIRA, 40, comandante de linha aérea, é presidente do Sindicato Nacional dos Aeronautas
 
 


Blog do Santayana, 13/11/2014



O Congresso e a desnacionalização do mercado aeronáutico brasileiro


Por Mauro Santayana


(Jornal do Brasil) - Acordo “costurado” ontem, no Senado, permitiu a aprovação, em comissão especial, de medida provisória que prevê subsídios à aviação regional, da forma como pretendia a Azul Linhas Aéreas. 

Isso evitou que o projeto viesse a beneficiar indiretamente, fabricantes estrangeiros de grandes aviões, como a Boeing e a Airbus, e ajudou a indústria brasileira, por meio da Embraer, que, no entanto, adquire boa parte das peças de suas aeronaves no exterior.

A surpresa ficou por conta de uma alteração feita de última hora no texto, aprovando a compra de até 100% do capital de companhias de aviação brasileiras por estrangeiros, indo contra o que se pratica em boa parte do mundo.

Se nossas grandes empresas, como a Gol, forem totalmente desnacionalizadas, o que ocorrerá quando gerentes norte-americanos ou europeus começarem a destratar funcionários nacionais de companhias aéreas aqui adquiridas, ou fizerem o mesmo com  viajantes brasileiros em nossos aeroportos ? 


Ou se a ANAC - Agência Nacional de Aviação Civil, ou as autoridades do Governo Federal tiverem suas regras contestadas, e forem processadas em tribunais de Atlanta ou Forth Worth, onde ficam situadas sedes de empresas estrangeiras, quando tentarem fazer valer sua autoridade, ou tomarem alguma decisão que contrarie, eventualmente, interesses de grupos como a Delta e a American Airlines ?  

Isso, sem falar de outros riscos, ligados à segurança nacional,  como a entrada clandestina de pessoal ou de equipamento não autorizado de outras nações em nosso território, caso a maioria das ações - e o comando de nossas companhias de aviação - venha a ficar em mãos estrangeiras, como se pretende, sem a exigência, ao menos, de uma maioria de capital nacional.

Mas o pior de tudo é a cabotinice, a cessão apressada de vantagens, com o mais absoluto desprezo pelos critérios de isonomia e reciprocidade.

Nem na Europa, nem nos Estados Unidos, empresas estrangeiras de aviação - incluídas as brasileiras - podem voar no mercado doméstico, e está vedado ao capital estrangeiro o controle de companhias locais de aviação. Na União Européia, empresas de fora desse grupo de países não podem adquirir mais de 49.9% das ações. E nos EUA, toda uma legislação protege o mercado com a intenção expressa de “garantir a proteção dos consumidores e dos empregos nos Estados Unidos.

Enquanto isso, no Brasil, queremos abrir, graciosamente, com uma canetada, aquele que já é o segundo maior mercado do mundo em número de aeroportos, e será, segundo a IATA - Associação Internacional de Transportes Aéreos, depois dos EUA e da China, o terceiro maior mercado doméstico do planeta, em 2017, daqui a apenas três anos, sem exigir absolutamente nada em troca.

O mercado brasileiro de aviação passou de 37,2 milhões de passageiros de avião em 2003, para mais de 100 milhões de passageiros em 2012, 88,7 milhões deles transportados em voos domésticos e 18,5 milhões nas rotas internacionais. O número alcançado em 2012 representou uma proporção de 55 passageiros transportados no modal aéreo para cada 100 habitantes no Brasil, enquanto que em 2003 essa mesma proporção era de 21 para 100.

É esse gigantesco negócio, com um enorme potencial de lucro e crescimento, que estamos entregando, de mão beijada, aos estrangeiros. Isso, caso não seja vetado o dispositivo apresentado ontem, pelo relator da MP 652, o senador Flexa Ribeiro, do PSDB do Pará, que revoga a parte do Código Brasileiro de Aeronáutica,  que exige que ao menos quatro quintos do capital votante das companhias aéreas instaladas no Brasil pertençam a cidadãos brasileiros.

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