Carta Maior, 18/12/2013
O Brasil não cabe na agenda de Aécio Neves
Por Saul Leblon
Pode-se discordar – por razões ideológicas - da regulação soberana instituída em dezembro de 2010 para a exploração do pré-sal.
Pode-se conceber, não sem razão, que a energia fóssil é uma fonte crepuscular de abastecimento da civilização.
Da transição dessa dependência para uma matriz menos poluente depende uma parte importante do futuro da sociedade humana.
Pode-se associar as duas coisas e disso extrair uma visão estratégica do passo seguinte do desenvolvimento brasileiro.
Mas, objetivamente, nenhuma agenda relevante de debate sobre os desafios brasileiros pode negligenciar aquela que é a principal fronteira crível do seu desenvolvimento nas próximas décadas.
Foi exatamente esse sugestivo lapso que cometeu um dos candidatos a candidato do dinheiro grosso em 2014.
O pré-sal brasileiro, a maior descoberta de petróleo registrada no planeta neste século, não cabe na agenda eleitoral de Aécio Neves, divulgada com o alarido previsível nesta 3ª feira.
Em oito mil e 17 palavras encadeadas em um jorro espumoso do qual se extrai ralo sumo, o presidenciável do PSDB não menciona uma única vez –repita-se-, uma única vez - o trunfo que mudou o perfil geopolítico do país: o pré-sal. Não é um simples tropeço da memória. A mais concreta possibilidade de emancipação econômica do país, não se encaixa na concepção de futuro do conservadorismo.
Em outras palavras: a omissão fala mais do que consegue esconder.
O pré-sal, sobretudo, avulta como o fiador das linhas de resistência do governo em trazer a crise global para dentro do Brasil, como anseia o conservadorismo.
Um dado resume todos os demais: estima-se em algo como 60 bilhões de barris os depósitos acumulados na plataforma oceânica. A US$ 100 o barril, basta fazer as contas para concluir: o Brasil não quebra porque passou a dispor de um cinturão financeiro altamente líquido expresso em uma fonte de riqueza sobre a qual o Estado detém controle soberano.
A agenda mercadista não disfarça o mal estar diante dessa blindagem, que esfarela a credibilidade do seu diagnóstico de um Brasil aos cacos.
Seu diagnóstico e a purga curativa preconizada a partir dele são incompatíveis com a existência desse incômodo cinturão estratégico.
Ao abstrair o pré-sal em oito mil e 17 palavras a agenda tucana mais se assemelha a uma viagem de férias à Disneylândia do imaginário conservador, do que à análise do Brasil realmente existente –com seus gargalos e trunfos.
Fatos: desde o início da crise mundial, em 2007, o Brasil criou 10 milhões de novos empregos.
Para efeito de comparação, a União Europeia fechou 30 milhões de vagas no mesmo período.
E condenou outros tantos milhões de jovens ao limbo, negando-lhes a oportunidade de uma primeira inserção no mercado de trabalho.
A Espanha, a título de exemplo, fez e faz, desde 2007, aquilo que o conservadorismo apregoa como panacéia para os males do Brasil hoje.
Com que desdobramentos palpáveis?
‘A Espanha levará 20 anos para recuperar os 3 milhões de empregos perdidos durante a crise global iniciada em 2008. A economia espanhola só conseguirá alcançar a taxa de desemprego de 6,8% - média na zona do euro, à exceção dos países do sul do continente - a partir de 2033’ (PricewaterhouseCoopers (PwC); estudo divulgado pela consultoria nesta terça-feira, 3/12).
A ênfase sobressaltada e seletiva da agenda tucana, insista-se, não decorre de escorregões da lógica.
Ela atende a interesses de bolso, ideologia e palanque.
A prostração inoculada diuturnamente pelo noticiário econômico é um dente dessa engrenagem, não um recorte isento do país.
A escolha menospreza singularidades que podem subverter a dinâmica da crise, entre elas a maior de todas: o impulso industrializante representado pelo pré-sal, uma oportunidade ímpar –talvez a última da história - de regenerar uma base fabril asfixiada por décadas de esmagamento cambial e competitivo.
Só se concebe desdenhar dessa fresta –como faz a agenda do PSDB— se a concepção de país aí embutida menosprezar o papel de um parque manufatureiro próprio.
Mais que isso: se a alavanca acalentada para devolver dinamismo à economia for o chamado ‘choque de competitividade’, tão a gosto da Casa das Garças tucana.
Do que consta?
Daquilo que a emissão conservadora embarcada na mesma agenda alardeia dia sim, o outro também.
Uma abrupta redução de tarifas que mataria um punhado de coelhos ao mesmo tempo: dizimaria o parque industrial ‘ineficiente’ –como fez Pinochet no Chile; como fizeram Ernesto Zedillo e Vicente Fox no México, com as maquiladoras; reduziria de imediato a inflação e despejaria boa parcela do operariado industrial na rua, barateando o ‘custo Brasil’ e aleijando os sindicatos e o PT.
É esse o recheio que pulsa na omissão ao pré-sal na agenda tucana.
O velho recheio feito de ingredientes tão excludentes que se recomenda dissimular em um texto eleitoral propagandístico: ajuste fiscal drástico; ampla abertura comercial; livre movimento de capitais; intensa privatização das empresas estatais (quando Aécio fala em ‘estatizar’ a Petrobrás é a novilíngua, em ação beligerante contra o PT); eliminação dos subsídios e incentivos a diferentes segmentos produtivos; cortes de direitos trabalhistas e de poder aquisitivo real dos salários.
Ou seja, o ideário neoliberal que jogou o planeta na crise na qual se arrasta há cinco anos.
Por último, ressuscitar o espírito do Nafta e atrelar a diplomacia do Itamaraty aos interesses norte-americanos.
Reconheça-se, não é fácil pavimentar o percurso oposto, como vem tentando o Brasil desde 2008.
O dinamismo industrial que o Brasil perdeu nas últimas décadas –sob cerco da importação barata da Ásia teria que ser substituído por um gigantesco esforço de inovação e redesenho fabril, a um custo que um país em desenvolvimento dificilmente poderia arcar.
O atraso na sua inserção nas grandes cadeias globais de fornecimento e tecnologia seria praticamente irreparável.
Exceto se tivesse em seu horizonte a exploração soberana, e o refino, das maiores jazidas de petróleo descobertas no século 21. Que farão do Brasil a maior fábrica de plataformas de petróleo do século XXI. Que já estão fazendo da ilha do Fundão , na URFJ, no Rio, um dos maiores centros de pesquisa tecnológica de energia do planeta.
É esse bilhete premiado que a agenda de Aécio omite olimpicamente: o trunfo que avaliza a possibilidade da reindustrialização, como resposta brasileira à crise.
O pré-sal não é uma panacéia, mas uma possibilidade.
Que já produz 400 mil barris/dia.
Em quatro anos, a Petrobras estará extraindo 1 milhão de barris/dia da Bacia de Campos.
Até 2017, a estatal vai investir US$ 237 bilhões; 62% em exploração e produção.
Dentro de quatro anos, os poços do pré-sal estarão produzindo um milhão de barris/dia. Em 2020, serão 2,1 milhões de barris/dia.
Praticamente dobrando da produção atual.
O pré-sal mudou o tamanho geopolítico do Brasil.
E pode mudar o destino do seu desenvolvimento.
Não é uma certeza, mas uma possibilidade histórica.
Os efeitos virtuosos desse salto no conjunto da economia brasileira exigem uma costura de determinação política.
Que a agenda eleitoral do PSDB renega e descarta.
Pode-se conceber, não sem razão, que a energia fóssil é uma fonte crepuscular de abastecimento da civilização.
Da transição dessa dependência para uma matriz menos poluente depende uma parte importante do futuro da sociedade humana.
Pode-se associar as duas coisas e disso extrair uma visão estratégica do passo seguinte do desenvolvimento brasileiro.
Mas, objetivamente, nenhuma agenda relevante de debate sobre os desafios brasileiros pode negligenciar aquela que é a principal fronteira crível do seu desenvolvimento nas próximas décadas.
Foi exatamente esse sugestivo lapso que cometeu um dos candidatos a candidato do dinheiro grosso em 2014.
O pré-sal brasileiro, a maior descoberta de petróleo registrada no planeta neste século, não cabe na agenda eleitoral de Aécio Neves, divulgada com o alarido previsível nesta 3ª feira.
Em oito mil e 17 palavras encadeadas em um jorro espumoso do qual se extrai ralo sumo, o presidenciável do PSDB não menciona uma única vez –repita-se-, uma única vez - o trunfo que mudou o perfil geopolítico do país: o pré-sal. Não é um simples tropeço da memória. A mais concreta possibilidade de emancipação econômica do país, não se encaixa na concepção de futuro do conservadorismo.
Em outras palavras: a omissão fala mais do que consegue esconder.
O pré-sal, sobretudo, avulta como o fiador das linhas de resistência do governo em trazer a crise global para dentro do Brasil, como anseia o conservadorismo.
Um dado resume todos os demais: estima-se em algo como 60 bilhões de barris os depósitos acumulados na plataforma oceânica. A US$ 100 o barril, basta fazer as contas para concluir: o Brasil não quebra porque passou a dispor de um cinturão financeiro altamente líquido expresso em uma fonte de riqueza sobre a qual o Estado detém controle soberano.
A agenda mercadista não disfarça o mal estar diante dessa blindagem, que esfarela a credibilidade do seu diagnóstico de um Brasil aos cacos.
Seu diagnóstico e a purga curativa preconizada a partir dele são incompatíveis com a existência desse incômodo cinturão estratégico.
Ao abstrair o pré-sal em oito mil e 17 palavras a agenda tucana mais se assemelha a uma viagem de férias à Disneylândia do imaginário conservador, do que à análise do Brasil realmente existente –com seus gargalos e trunfos.
Fatos: desde o início da crise mundial, em 2007, o Brasil criou 10 milhões de novos empregos.
Para efeito de comparação, a União Europeia fechou 30 milhões de vagas no mesmo período.
E condenou outros tantos milhões de jovens ao limbo, negando-lhes a oportunidade de uma primeira inserção no mercado de trabalho.
A Espanha, a título de exemplo, fez e faz, desde 2007, aquilo que o conservadorismo apregoa como panacéia para os males do Brasil hoje.
Com que desdobramentos palpáveis?
‘A Espanha levará 20 anos para recuperar os 3 milhões de empregos perdidos durante a crise global iniciada em 2008. A economia espanhola só conseguirá alcançar a taxa de desemprego de 6,8% - média na zona do euro, à exceção dos países do sul do continente - a partir de 2033’ (PricewaterhouseCoopers (PwC); estudo divulgado pela consultoria nesta terça-feira, 3/12).
A ênfase sobressaltada e seletiva da agenda tucana, insista-se, não decorre de escorregões da lógica.
Ela atende a interesses de bolso, ideologia e palanque.
A prostração inoculada diuturnamente pelo noticiário econômico é um dente dessa engrenagem, não um recorte isento do país.
A escolha menospreza singularidades que podem subverter a dinâmica da crise, entre elas a maior de todas: o impulso industrializante representado pelo pré-sal, uma oportunidade ímpar –talvez a última da história - de regenerar uma base fabril asfixiada por décadas de esmagamento cambial e competitivo.
Só se concebe desdenhar dessa fresta –como faz a agenda do PSDB— se a concepção de país aí embutida menosprezar o papel de um parque manufatureiro próprio.
Mais que isso: se a alavanca acalentada para devolver dinamismo à economia for o chamado ‘choque de competitividade’, tão a gosto da Casa das Garças tucana.
Do que consta?
Daquilo que a emissão conservadora embarcada na mesma agenda alardeia dia sim, o outro também.
Uma abrupta redução de tarifas que mataria um punhado de coelhos ao mesmo tempo: dizimaria o parque industrial ‘ineficiente’ –como fez Pinochet no Chile; como fizeram Ernesto Zedillo e Vicente Fox no México, com as maquiladoras; reduziria de imediato a inflação e despejaria boa parcela do operariado industrial na rua, barateando o ‘custo Brasil’ e aleijando os sindicatos e o PT.
É esse o recheio que pulsa na omissão ao pré-sal na agenda tucana.
O velho recheio feito de ingredientes tão excludentes que se recomenda dissimular em um texto eleitoral propagandístico: ajuste fiscal drástico; ampla abertura comercial; livre movimento de capitais; intensa privatização das empresas estatais (quando Aécio fala em ‘estatizar’ a Petrobrás é a novilíngua, em ação beligerante contra o PT); eliminação dos subsídios e incentivos a diferentes segmentos produtivos; cortes de direitos trabalhistas e de poder aquisitivo real dos salários.
Ou seja, o ideário neoliberal que jogou o planeta na crise na qual se arrasta há cinco anos.
Por último, ressuscitar o espírito do Nafta e atrelar a diplomacia do Itamaraty aos interesses norte-americanos.
Reconheça-se, não é fácil pavimentar o percurso oposto, como vem tentando o Brasil desde 2008.
O dinamismo industrial que o Brasil perdeu nas últimas décadas –sob cerco da importação barata da Ásia teria que ser substituído por um gigantesco esforço de inovação e redesenho fabril, a um custo que um país em desenvolvimento dificilmente poderia arcar.
O atraso na sua inserção nas grandes cadeias globais de fornecimento e tecnologia seria praticamente irreparável.
Exceto se tivesse em seu horizonte a exploração soberana, e o refino, das maiores jazidas de petróleo descobertas no século 21. Que farão do Brasil a maior fábrica de plataformas de petróleo do século XXI. Que já estão fazendo da ilha do Fundão , na URFJ, no Rio, um dos maiores centros de pesquisa tecnológica de energia do planeta.
É esse bilhete premiado que a agenda de Aécio omite olimpicamente: o trunfo que avaliza a possibilidade da reindustrialização, como resposta brasileira à crise.
O pré-sal não é uma panacéia, mas uma possibilidade.
Que já produz 400 mil barris/dia.
Em quatro anos, a Petrobras estará extraindo 1 milhão de barris/dia da Bacia de Campos.
Até 2017, a estatal vai investir US$ 237 bilhões; 62% em exploração e produção.
Dentro de quatro anos, os poços do pré-sal estarão produzindo um milhão de barris/dia. Em 2020, serão 2,1 milhões de barris/dia.
Praticamente dobrando da produção atual.
O pré-sal mudou o tamanho geopolítico do Brasil.
E pode mudar o destino do seu desenvolvimento.
Não é uma certeza, mas uma possibilidade histórica.
Os efeitos virtuosos desse salto no conjunto da economia brasileira exigem uma costura de determinação política.
Que a agenda eleitoral do PSDB renega e descarta.
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