quinta-feira, 3 de abril de 2014

Abilio Diniz: Crescimento da economia não depende só do governo

UOL, 03/04/2014


Crescimento da economia não depende só do governo


Por Abilio Diniz
Especial para o UOL


Ao longo da minha vida, sempre procurei fazer tudo o que depende de mim e não ficar esperando que os outros façam isso ou aquilo. Se alguma coisa dá errado, eu olho no espelho, não pela janela.
Não procuro buscar desculpas ou culpados pelos erros. Pergunto sempre: será que eu fiz certo aquilo que depende de mim? Essa é a maneira que eu encaro a vida.
Hoje, no nosso país, vejo uma grande quantidade de pessoas se queixando do governo e dos governantes. Não nego que existam motivos para descontentamentos. Muita coisa poderia ser feita de forma diferente, e os brasileiros se sentiriam mais satisfeitos. Mas, embora existam muitas razões para nos queixarmos dos governantes, estou sempre indagando: será que estamos fazendo aquilo que depende de nós?
Não quero minimizar os problemas brasileiros, eles precisam ser enfrentados. Mas, se continuarmos apontando os erros dos governantes enquanto fizermos a nossa parte, o Brasil poderá ter mais crescimento e mais desenvolvimento.
O caminho para esse desenvolvimento é o aumento da produtividade, com mais gestão, mais investimentos e mais capacitação dos trabalhadores.
Foi o que sempre procurei fazer ao longo da minha vida, primeiro no Grupo Pão de Açúcar e agora na BRF. São duas empresas muito diferentes, atuando em setores distintos. Mas, como ensino aos meus alunos do curso de liderança da Fundação Getulio Vargas, todas as empresas são, na essência, gente e processo, processo e gente. Ter os processos mais adequados de gestão e produção aplicados pelas pessoas mais capacitadas.
Seguindo essa fórmula, simples, mas não necessariamente fácil, a produtividade aumenta, a empresa prospera, os investimentos dão retorno. É disso que as empresas precisam, é disso que a economia brasileira precisa.
Nos últimos anos, o Brasil desfrutou do bônus da estabilização econômica e política e de uma conjuntura global favorável, combinação que nos permitiu dar um salto de desenvolvimento com inclusão social. Dezenas de milhões de pessoas entraram no mercado consumidor, milhões de empregos foram criados. A taxa de desemprego, que iniciou o século acima dos 10%, caiu para menos de 6% hoje em dia.
O alto desemprego no início da estabilização e a capacidade de produção ociosa forneceram mão de obra e meios relativamente baratos para as empresas expandirem a produção. Mais emprego trouxe mais renda, que aumentou a demanda por produtos, expandiu o mercado e estimulou novos investimentos.
Este círculo virtuoso, porém, atinge seus limites, e a produtividade é o caminho para sustentar o desenvolvimento, como mostra estudo recente do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).
De autoria dos economistas Regis Bonelli e Julia Fontes, a pesquisa mostra como a economia e a produção brasileira cresceram absorvendo aquele enorme contingente de desempregados - principalmente no setor de serviços, intensivo em mão de obra -, sem precisar aumentar a produtividade média do trabalhador de forma significativa, como ocorreu em outros países.
Mas, com o Brasil rodando praticamente a pleno emprego e a transformação demográfica que reduziu o número de filhos por família, não é possível mais crescer via aumento do emprego e do consumo interno. O Ibre aponta que, mesmo mantido o atual (e insatisfatório) ritmo de crescimento da economia, faltaria trabalhador no mercado, como já ocorre em algumas áreas.
O caminho para o crescimento agora passa necessariamente pelo aumento da produção média de cada trabalhador, não mais pelo aumento do número de trabalhadores.
Não é um caminho fácil, mas é um caminho claro. Não depende só das empresas e dos trabalhadores. Entre os maiores entraves à produtividade brasileira estão a precariedade da infraestrutura e a baixa qualidade da educação em todos os níveis.
Há, portanto, um papel fundamental dos governos nesse esforço indispensável pela produtividade. Podemos criticá-los e devemos cobrá-los nesse sentido. Mas podemos fazer muita coisa dentro de nossas empresas, com os processos certos e as pessoas certas.
Aprendi na minha vida que fazer traz muito mais resultado do que esperar e criticar. A corrida da produtividade já começou, e quem sair na frente terá mais chance de chegar lá.

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