sábado, 22 de julho de 2017

UPP: desastre anunciado





CartaCapital, 22/07/17



Rio de Janeiro

UPP: desastre anunciado



Por Mauricio Dias




Acabou-se o que, aos cariocas, parecia doce. As Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), festejadas como solução para o combate à violência no Rio de Janeiro, fracassaram. E não foi por falta de tiro. É um infortúnio ainda não anunciado oficialmente. A trama, entretanto, iniciada no fim de 2008, sustenta hoje 38 Unidades e absorve quase 10 mil policiais militares, outrora responsáveis pela prevenção da ordem pública e, hoje, encarregados de manter uma guerra perdida.

Enquanto os moradores da capital e da periferia ingenuamente comemoravam as UPP, estimulados pela algazarra da mídia, uma minoria lamentava preocupadamente que a festa não chegaria ao fim. Um dos primeiros gritos de alerta, se não o primeiro, foi dado por Vera Malaguti, professora-adjunta de Criminologia na Faculdade de Direito da Uerj. Ela remou, corajosamente, contra a maré. Agora a água virou o curso a favor dela.

Malaguti reafirma o que sempre disse: “Nos últimos anos, o Rio de Janeiro foi um laboratório de experimentos do mercado internacional de ‘segurança pública’. As UPP, acopladas ao projeto político do PMDB fluminense, utilizavam teorias, estratégias e tecnologias elaboradas principalmente pelas ocupações militarizadas dos EUA e de Israel. Atrás do discurso social das UPP escondia-se a intensificação da militarização e da transformação dos bairros pobres em territórios hostis”.

Ela explica que, nos últimos 40 anos, “como as UPP”, a guerra contra as drogas escondeu seus reais objetivos: “A escalada da militarização da segurança pública e a transformação dos países produtores das substâncias eleitas pelo ‘proibicionismo’ em território inimigo. Na prática, essa guerra não diminui nem a produção nem o comércio e nem mesmo o consumo daquelas substâncias”.

O objetivo talvez nunca tenha sido esse. A intenção foi o de “transformar as áreas pobres da América Latina em palco de combates sangrentos que apontam para os maiores níveis de homicídio do mundo”.

A guerra contra as drogas é uma guerra que ocorre totalmente fora das regras e das convenções internacionais, e sim como um bárbaro banho de sangue, naturalizado e legitimado se seus mortos são traficantes”, assinala Malaguti. E vai em frente: “A lógica de guerra entranhou-se de tal forma que temos hoje policiais civis de coletes e fuzis, policiais federais de coturno, promotores e juízes combatentes, agentes penitenciários militarizados, helicópteros, caveirões e equipamentos de vigilância”.

Vera Malaguti reage ao processo de atuação repressiva na cidade e denuncia a falta de “um sentido lógico numa operação policial que põe em risco o funcionamento de uma escola e a segurança física das crianças”. Restou ao carioca tramitar do prazer inicial com as UPP ao sentimento do gosto de sangue que escorre de policiais militares, de traficantes e, principalmente, da gente inocente do morro e do asfalto.

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