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22/03/2013
Polícia apresenta inquérito e aponta 35 responsáveis por incêndio na boate Kiss
Do UOL, em São Paulo e Santa Maria (RS)
A Polícia Civil do Rio Grande do Sul entregou o inquérito sobre o incêndio na boate Kiss, em Santa Maria (RS), que deixou 241 mortos no último dia 27 de janeiro, nesta sexta-feira (22) e responsabilizou 35 pessoas pela tragédia. O documento aponta 16 indiciamentos de forma direta e outros 10 indícios de crime (nove que vão para a Justiça Militar e um para o Tribunal de Justiça). Outras nove pessoas responderão por improbidade administrativa.
Entre os indiciados estão os sócios da boate Kiss, Elissandro Spohr, o Kiko, e Mauro Hoffman, e os integrantes da banda Gurizada Fandangueira Luciano Augusto Bonilha Leão e Marcelo de Jesus dos Santos, que já estavam presos preventivamente na penitenciária estadual de Santa Maria. Os quatro são acusados de homicídio com dolo eventual triplamente qualificado.
Além deles, foram indiciados pelo mesmo crime Angela Aurelia Callegaro, irmã de Kiko, sua mãe, Marlene Callegaro, o gerente da boate, Ricardo de Castro Pasche, e os bombeiros Gilson Martins Dias e Vagner Guimarães Coelho, responsáveis pela fiscalização.
Foram indiciados por homicídio culposo (sem intenção de matar) Miguel Caetano Passini, atual secretário de Mobilidade Urbana, Luiz Alberto Carvalho Junior, secretário do Meio Ambiente, Beloyannes Orengo de Pietro Júnior, chefe da fiscalização da Secretaria de Mobilidade Urbana, e Marcus Vinicius Bittencourt Biermann, funcionário da Secretaria de Finanças que emitiu o alvará de localização da boate Kiss.
O major Gerson da Rosa Pereira e o sargento Renan Severo Berleze, ambos do Corpo de Bombeiros e acusados de incluir documentos na pasta do alvará da boate, foram indiciados por fraude processual. O ex-sócio da Kiss Eltron Cristiano Uroda foi indiciado por falso testemunho.
Segundo o inquérito, há indícios de prática de crime de homicídio culposo na conduta dos bombeiros Moisés da Silva Fuchs (comandante regional do Corpo de Bombeiros de Santa Maria), Alex da Rocha Camillo, Robson Viegas Müller, Sergio Rogério Chaves Gulart, Dilmar Antônio Pinheiro Lopes, Luciano Vargas Pontes, Eric Samir Mello de Souza, Nilton Rafael Rodrigues Bauer e Tiago Godoy de Oliveira. Os nove serão investigados pela Justiça Militar.
A polícia também apontou indícios de prática de homicídio culposo por parte do prefeito de Santa Maria, Cezar Schirmer. A acusação será apurada pelo Tribunal de Justiça. "Concluímos aqui nosso papel. Cabe agora ao MP e à Justiça", afirmou o delegado que presidiu o inquérito, Marcelo Arigony.
Neste momento, os cinco indiciados que ainda não haviam sido presos permanecerão em liberdade. "Havia diversas circunstâncias desfavoráveis. Era uma casa que funcionava na ilegalidade", avaliou Arigony.
Em relação à atuação dos bombeiros socorristas que estiveram no local, a polícia é incisiva: "houve uma falha severa [dos bombeiros]. Sabemos que era um ambiente hostil, mas as pessoas que estavam do lado de fora não poderiam retornar. Homicídio culposo porque eles não poderiam deixar as pessoas retornarem para a boate. Mesmo assim, ficou apontado que os bombeiros poderiam fazer mais e melhor", explicou o delegado Sandro Meinerz.
Prefeitura
Questionado sobre o papel da prefeitura municipal no auxílio às investigações, a polícia foi enfática: "tivemos certa morosidade no início [durante pedido de auxílio] e recebemos uma denúncia de que alguns documentos estavam sendo sonegados", revela Arigony.
"Conversamos com o Ministério Público e foram dois delegados e um promotor até a prefeitura. Foram encontrados alguns documentos e, entre eles, o mais relevante que existe, e que a prefeitura não tinha nos encaminhado. Um documento que tem 29 apontamentos feitos por um arquiteto de carreira do município dizendo que aquela boate não poderia funcionar", salientou.
A reportagem do UOL tentou contato telefônico com a Prefeitura de Santa Maria, mas não obteve resposta.
Inquérito
O documento de 10 mil páginas foi apresentado na tarde de hoje pela Polícia Civil no campus da UFSM (Universidade Federal de Santa Maria). Os delegados também mostraram dois vídeos impressionantes do momento em que o incêndio começou dentro da boate.
Por 55 dias, cinco dezenas de policiais, peritos e assessores trabalharam em conjunto para colher 800 depoimentos e realizar perícias que sustentam o inquérito.
"O trabalho desenvolvido foi muito complexo. É o maior inquérito da Polícia Civil do Rio Grande do Sul", afirmou o chefe da Polícia Civil do Estado, Ranolfo Vieira Junior, antes da apresentação do inquérito.
O delegado regional, Marcelo Arigony, foi o responsável por detalhar como foram feitas as investigações. Segundo ele, os 234 autos de necropsia assinados pelo IGP (Instituto Geral de Perícias) atestam que 100% das mortes foram causadas por asfixia. "O desprendimento do monóxido de carbono e do cianeto com a queima da espuma do isolamento acústico causaram as mortes", explicou.
Na madrugada de hoje, os volumes do inquérito foram transportados da 1ª Delegacia de Polícia de Santa Maria para a Delegacia Regional. Antes da apresentação na UFSM, o material foi levado ao Fórum de Santa Maria e protocolado na 1ª Vara Criminal. O Ministério Público irá analisar o inquérito e, se concordar com a Polícia Civil, irá formalizar a denúncia à Justiça.
Cianeto e superlotação
O laudo do IGP sobre a liberação de gases tóxicos pela espuma de poliuretano que revestia o teto da boate Kiss, em Santa Maria (RS), já havia confirmado que o incêndio produziu cianeto, monóxido de carbono e dióxido de carbono em quantidade suficiente para asfixiar as pessoas que morreram na tragédia.
O documento informa que a queima da espuma liberou três tipos de gases suficientes para asfixiar as pessoas que estavam dentro da Kiss no momento do incêndio. O resultado foi obtido depois que amostras do material foram queimadas com um artefato pirotécnico do mesmo tipo do utilizado no show da banda Gurizada Fandangueira.
Outro ponto levantado pelos técnicos é que a casa comportava no máximo 750 pessoas. De acordo com os delegados que presidem o inquérito, ao menos mil clientes estavam na boate na noite do incêndio, o que indicaria superlotação.
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