domingo, 29 de setembro de 2013

Jornadas de junho: jovens, trabalhado​res e descrentes da ascenção social

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Domingo, 29 de Setembro de 2013
 
 
Jornadas de junho: jovens, trabalhadores e descrentes da ascenção social
 
 
 
Antonio Lassance 
 

 
Os manifestantes das jornadas de junho deste ano eram sobretudo jovens trabalhadores e descrentes da ascenção social . Essa é uma das conclusões da pesquisa coordenada pelo professor Marcelo Ridenti, da Universidade de Campinas (Unicamp), apresentada em mesa do encontro da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs).

Segundo Ridenti, os manifestantes souberam se expressar nos moldes da sociedade do espetáculo e da cultura da celebridade, disse fazendo referência a Guy Debord (1931-1994) e sua obra, "A Sociedade do Espetáculo" (DEBORD, Guy. La société du spetacle. Paris, Buchet-Chastel, 1967).
O professor destaca a diferença essencial dos protestos ocorridos no Brasil em relação a outros países. Por aqui, são jovens com emprego. A maioria trabalha, são recém-formados e nem sempre encontram, no trabalho, a possibilidade de manter o mesmo padrão de vida familiar ao qual estavam acostumados em suas famílias de classe média. Desconfiam de suas próprias possibilidades de ascensão social pelo estudo.
Uma pesquisa anterior, feita pelo Ibope, trouxe dados similares ao do perfil encontrado pelos pesquisadores da Unicamp. Cerca de 63% dos manifestantes tinham entre 14 a 29 anos, enquanto 18% tinham entre 30 a 29 anos. Cerca de 93% tinham o ensino fundamental completo e nível superior incompleto ou já completo. Em torno de 76% trabalham. A maioria ganha entre 2 a 5 salários mínimos, sendo que 26% estão na faixa de remuneração de 5 a 10 salários mínimos.

É uma contradição da própria melhoria das condições sociais do país na última década
. Hoje, conforme lembra Ridenti, existem quase 7 milhões de universitários, o dobro do que era, uma década atrás.As chances de ascensão, nesse sentido, exigem mais dos jovens de classe média, hoje, do que no passado. Seu futuro é incerto. A única coisa segura é que eles vieram para ficar. 
Antonio Lassance é cientista político e pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). As opiniões expressas neste artigo não refletem necessariamente opiniões do Instituto.

Mídia agora persegue namorada de Zé Dirceu

 
 
29 de setembro de 2013
 

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Mídia agora persegue namorada de Zé Dirceu

 
Por Miguel do Rosário
 
Reproduzo abaixo artigo de Paulo Nogueira, no qual o jornalista discorre sobre a triste parcialidade da mídia brasileira em sua perseguição obsessiva a José Dirceu. Perseguição que se estende a tudo à volta de Dirceu. Agora, a mídia resolveu perseguir a namorada de Dirceu porque ela conseguiu um emprego.
Ontem, Merval Pereira também mencionava Dirceu, numa frase irresponsável:
O surgimento de José Dirceu por trás do “fenômeno” Midia Ninja, depois das manifestações de junho (…)
A única ligação entre Dirceu e a mídia ninja era uma foto de Pablo Capilé em que Dirceu aparece ao fundo. O vale tudo da mídia atingiu as raias do ridículo.
Nogueira esqueceu de mencionar a filha de FHC, funcionária fantasma, por anos a fio, no gabinete do senador Heráclito Fortes (DEM-PI), fato que também jamais incomodou os catões que perseguem José Dirceu.

Abaixo, o artigo de Nogueira:

Não é fácil ser Zé Dirceu
Por Paulo Nogueira, no Diario do Centro do Mundo

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Não é fácil ser Zé Dirceu. E nem ter qualquer tipo de relação com ele. Namoradas, então, são um alvo constante.
Recebi logo pela manhã, pelo Facebook, o link de um artigo de Josias de Souza, blogueiro do UOL. Ele espalhava uma (suposta) informação que saíra na Veja: a (alegada) namorada de Dirceu conseguira um emprego no Senado.
Você pode imaginar os detalhes dados, do salário à carga horária: em suma, segundo a Veja e Josias, ela ganha muito e trabalha pouco.
Não vou discutir aqui a credibilidade da Veja. Mas não posso deixar de lembrar que, em sua louca cavalgada rumo à direita, a revista apresentou Maycon Freitas como “a voz que emergiu das ruas”, nos protestos de junho.
A credencial de Maycon, logo se veria, era falar exatamente o que a Veja queria que ele falasse. Sozinho, ele não mobilizava pessoas capazes de lotar uma padaria no domingo.
Mas volto ao caso em questão.
A funcionária do Senado apedrejada, Simone Patrícia Tristão Pereira, tem vida profissional anterior, como uma simples pesquisa no Google mostra.
Em 2011, o governador do Estado de Tocantins, Siqueira Campos, a nomeou assessora especial da Secretaria da Cultura.
O governador, apenas para registro, é do PSDB. Isto quer dizer o seguinte: a informação que você está lendo aqui, no DCM, não vai aparecer em nenhum lugar que quer atacar Simone e, por ela, Dirceu.
Também é bom lembrar que o “moralismo” impregnado na “denúncia” não se manifestou, jamais, quando Serra arrumou empregos para Soninha e familiares no governo paulista.
A mídia também jamais colocou em dúvida a competência do então genro de FHC, David Zylbersztajn, quando ele foi colocado à frente da Agência Nacional do Petróleo no governo do sogro.

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Antes da ANP, e já genro do FHC, o então governador Mário Covas deu a ele a Secretaria da Energia. Mas claro: aí era, para a mídia, talento, mérito, e não nepotismo.
Zylbersztajn deixou a ANP pouco depois de se separar da filha de FHC. Hoje, ele tem negócios da área de energia, e ninguém questiona a ética disso. Assim como ninguém cobra de Malan, ou de Gustavo Franco, posições pós-governo lucrativas.
Dirceu, em compensação, é constantemente massacrado por qualquer coisa que faça. Lembro de um Roda Viva em que ele fez a pergunta vital: “Não posso trabalhar?”
A Veja simplesmente ignorou a notícia do emprego que a Globo deu ao filho de Joaquim Barbosa. Cinicamente, alguém poderia dizer: mas é uma empresa.
Ora, quem acredita nessa desculpa acredita em tudo. É o chamado “nepotismo cruzado”. Emprego seu filho, mas você sabe que me deve um favor.
A Globo está no meio de um escândalo – não coberto pela mídia – de sonegação e trapaça fiscal. Neste caso apenas (há outros), deve em dinheiro de hoje 1 bilhão de reais.
O presidente do STF deve empregar o filho numa empresa em tal situação?
O Brasil tem que ser reformado, é verdade. Mas a reforma que a mídia propõe se centra na manutenção de todos os seus privilégios, acrescidos de mais alguns, se possível.
Para isso, vale tudo – a começar por dar ares de escândalo a qualquer coisa que possa atingir quem ela julga ser seus inimigos, como Dirceu.

29/09/1964 - É publicada pela primeira vez tira de Mafalda, do argentino Quino

 
 
Ópera Mundi, 29/09/2013
 
 
Hoje na História: 1964 - É publicada pela primeira vez tira de Mafalda, do argentino Quino
 
 
Reprodução
Mafalda foi uma tira escrita e desenhada pelo cartunista argentino Quino. As histórias, apresentando uma menina (Mafalda) preocupada com a humanidade e a paz mundial que se rebela com o estado atual do mundo, apareceram de 1964 a 1973 (a primeira em 28 de agosto), gozando de alta popularidade na América Latina e Europa. Mafalda foi muitas vezes comparada ao personagem Charlie Brown de Charles Schulz, principalmente pelo escritor italiano Umberto Eco. Segundo ele, as inquietudes manifestadas por Mafalda e seus amigos são de índole universal. Foi traduzida em mais de trinta idiomas.
Mafalda somente se tornou ‘cartoon’ de verdade por sugestão de Juián Delgado, à época editor-chefe do hebdomadário Primera Plana. Publicado em 29 de setembro de 1964 apresentava apenas Mafalda e seus pais.

Em 1962, Quino já trabalhava há uma década com humor gráfico, quando seu amigo Miguel Brascó, humorista e escritor, foi contatado pela “Agens Publicidad” para criar uma tira com historietas a fim de promover a marca de eletrodomésticos “Mansfield”. A tira funcionaria como publicidade encoberta em meios impressos. Brascó recordou que Quino lhe havia comentado “que tinha vontade de desenhar uma tira com crianças” e lhe sugeriu compor uma historieta que combinasse “Peanuts” com “Blodie”. A empresa pôs condição que na história aparecessem eletrodomésticos e os personagens começassem com “M”.
Quino esboçou tiras protagonizadas por uma família típica constituída por um casal de classe média com dois filhos: um menino e uma menina. O nome Mafalda da menina foi tomado do filme Dar la Cara (1962), baseado no romance homónimo de David Viñas, em que há um bebê que tem esse nome, e pareceu muito sugestivo a Quino.

A historieta foi oferecida pela Agens ao jornal Clarín, porém o estratagema publicitário foi descoberto e a companha, deixada de lado. No entanto, Brascó publicou no suplemento humorístico “Gregório” três das tiras desenhadas para a campanha falida.

Em 1964, Delgado, diretor da revista Primera Plana, pede a Quino publicar nesse meio a Mafalda, já desvinculada propósitos publicitários. Quino desenha tiras em que só participam Mafalda e seus país. Com o tempo, foi agregando personagens, amigos de Mafalda - Felipe, Manolito, Susanita, Miguelito e Libertad – e seu irmãozinho Guille.

Mafalda representa a aspiração idealista e utópica de fazer um mundo melhor, malgrado o pessimismo e a preocupação pelas circunstâncias sócio-políticas que afetam permanentemente nosso planeta. Os comentários de Mafalda são espelho das inquietações do mundo dos anos 1960. Ela denuncia a maldade e a incompetência dos homens e a ingenuidade das soluções propostas para os problemas mundiais, como a fome e a guerra.
 
Entusiasta dos Beatles, do Pássaro Louco e das panquecas, detesta a sopa. Incomoda os adultos com seus questionamentos sobre o socialmente estabelecido e suas perguntas à condução política do mundo. Está convencida do progresso social da mulher. Imagina-se estudando idiomas e trabalhando como intérprete nas Nações Unidas para contribuir com a paz no mundo.

Ao começar a tira, Mafalda tinha quatro anos e no mês de março ingressa no jardim de infância. Nos dez anos do desenrolar da história chega ao terceiro ou quarto ano da escola primária.

Wikimedia Commons

Praça Mafalda, em Buenos Aires, com os personagens da tirinha

 
Quanto aos demais personagens temos:

O pai de Mafalda e Guille: a tira não revela seu nome e sobrenome. Empregado típico de escritório, homem probo que trabalha como corretor de seguros. Preocupado em economizar, não compreende os avanços e desafios das novas gerações.

Raquel, a mãe de Mafalda e Guille é uma típica dona de casa de classe média dos anos 1960, ocupada unicamente com o seu lar. Não necessita muito para ser feliz e dá lições de humildade e sacrifício aos seus filhos, inquieta com as adversidades do mundo.

Felipe, amigo de Mafalda: está um ano à sua frente, mas sua personalidade é mais simples e ingênua. Sonhador, tímido, vive agoniado com suas tarefas escolares.

Manolito amigo de Mafalda: filho de um comerciante do bairro,  representa as ideias capitalistas e conservadoras, além de construir uma caricatura de imigrante galego espanhol. É tosco, ambicioso e materialista.

Susanita, amiga de Mafalda: Até a chegada de Libertad, são as únicas mulheres do grupo. Linguaruda, briguenta e fofoqueira, nada que se passa na vizinhança que não esteja a par. Além do mais é racista, despreza os pobres, admira a oligarquia e é preocupada com a moda e a imagem.

Miguelito, amigo de Mafalda: mais sonhador que Felipe, costuma fazer perguntas complexas e absurdas sobre a realidade. É o mais inocente da turma e passa de etéreas reflexões – “como o tempo fará para dobrar as esquinas em relógios quadrados?” – a típicas queixas de crianças. Algo egoísta, é um fervoroso defensor de Benito Mussolini, inculcado por seu avô.

Guille é o irmão menor de Mafalda e o único personagem que cresce fisicamente ao longo das tiras. Apesar de sua inocência, aprecia Brigitte Bardot, é algo irreverente e gosta de sopa. Costuma provocar a ira e o nojo de sua irmã.

Libertad, amiga de Mafalda e último personagem a se juntar à turma. Baixinha, é motivo de gozação dos demais da turma. Tem personalidade, conversa com Mafalda sobre temas sociais e políticos. Concordam ideologicamente, todavia Mafalda é mais realista.

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

E se fosse a Rússia (ou o Irã) que espionasse o Brasil?


 
 
 
E se fosse a Rússia (ou o Irã) que espionasse o Brasil?
 
 
Washington Araújo
 
 
 
"Jamais pode uma soberania firmar-se em detrimento de outra. Jamais pode o direito à segurança dos cidadãos de um país ser garantido mediante a violação de direitos humanos fundamentais dos cidadãos de outro país. Sem respeito à soberania, não há base para o relacionamento entre as nações” (Dilma Rousseff, abrindo a 68ª Assembleia Geral das Nações Unidas, em 24/9/2013)


Dois pesos e duas medidas’ – expressão geralmente usada para denunciar injustiça patente, evidente, clamorosa, é máxima recorrente para identificar julgamento parcial, faccioso, eivado de segundas e terceiras intenções, quando o bem maior a ser protegido passa a ser o interesse particular em detrimento ao interesse coletivo.

Mas, nos dias atuais, a expressão cai como luva para certo tipo de jornalismo.

O jornalismo que manda às favas a busca da verdade, que tem partido, ideologia, interesses econômico-financeiros
. O jornalismo que abdica de sua função de bem informar, de ouvir o outro lado, de conferir as fontes e as informações, de distinguir entre fatos e versões, entre evidências e meras suposições. É o jornalismo que prefere encampar como recurso procedimental a teoria do domínio do fato. Teoria em que as intenções pesam mais que as ações realizadas, verificáveis, constatáveis. Em grande medida, o jornalismo brasileiro nos dias que correm.

Façamos breve exercício mental sobre o enfoque jornalístico de temas muito atuais que vez por outra tomam de assalto as capas das revistas semanais, as capas dos jornais diários, a escalada dos telejornais mais tradicionais e de maior audiência aferível:

A espionagem orquestrada e executada pelo governo dos Estados Unidos em solo brasileiro e tendo como alvos nada menos que a Presidenta da República e a sua mais importante empresa, a Petrobrás, isto para circunscrevermos apenas dois dos mais vistosos e importantes alvos, seria razoável supor que muitas outras autoridades, personalidades estão sendo alvos de espionagem de Washington.

Não estaria sendo espionando o Ministério da Defesa?

Vejamos, é ele que coordena a megalicitação para aquisição de 36 caças para reequipar a Força Aérea brasileira, negócio exuberante que ultrapassa os US$ 15 bilhões e, com um detalhe, concorrendo com a Boeing dos Estados Unidos, encontram-se o Rafale da França e o Gripen NG, da sueca Saab. Outro detalhe, a concorrência se arrasta já há mais de uma década.

Não estaria sendo espionado o Ministério das Minas e Energia?
Vejamos, é ele que coordena, estuda e discute políticas de governo para a extração do petróleo no pré-sal, significando para especialistas em energia novo Eldorado mundial fornecedor de petróleo. Seria deixado de fora da bisbilhotice norte-americana?

Não estaria sendo espionado o Ministério da Agricultura?
Vejamos, o Brasil está há muitos anos à frente da moderna pesquisa agropecuária e sua principal estrela na área é a Embrapa, ganhadora de diversos prêmios do setor, seja no campo da pesquisa pura de sementes e defensores agrícolas, seja no aspecto inovação, todos atuando na otimização de crescentes safras agrícolas.

Não estaria espionando o Ministério das Relações Exteriores?
Vejamos, o Brasil, à custa de muito esforço e perseverança conseguiu por de pé o seu bloco econômico e político de integração continental – o Mercosul, e, ademais, firmou sua liderança em organismos multilaterais como o G-20, o BRICs, tendo atuação de destaque tanto nos Fóruns Mundiais Sociais (por sinal, criado no Brasil) quanto no Fórum de Davos, na Suíça; iniciou parcerias estratégicas com a China (que já suplantou os EUA como maior parceiro comercial do país) e com os vizinhos Bolívia, Argentina, Venezuela; atuou junto ao governo turco para encontrar solução pacífica para os muitos problemas criados pelo Irã, como aqueles relacionados ao desenvolvimento de energia nuclear, beligerância permanente com Israel, escalada de violação dos direitos humanos.

Não estaria sendo espionada toda a região da Amazônia Legal?
Vejamos, não é de hoje que estudantes do ensino médio dos Estados Unidos aprendem a ler mapas geográficos em que a Amazônia brasileira ao invés de fazer parte do Brasil, é nada menos que um enclave governado pelo Sistema Nações Unidas e, também, considerando sua condição de “pulmão do planeta” e de possuir o mais extenso e volumoso reservatório de água potável do mundo, além de sua exuberante fauna e flora para pesquisas no campo da biotecnologia e dos fármacos, dificilmente estaria distante das preocupações dos serviços de inteligência dos Estados Unidos.

Tendo o Brasil assumido – e em larga medida - sua condição de líder latino-americano, sua pujante economia, com o êxito de suas políticas públicas de erradicação da fome e da miséria, tais contornos tornam o país alvo preferencial para espionagem, em especial, por quem nutre históricos anseios imperialistas e hegemônicos.

Em meio a essa avalancha de informações vazada de dentro do próprio coração de seus organismos de inteligência (espionagem e contraespionagem), causa espécie observar a tibieza quando não a leniência com que o assunto vem sendo abordado por nossa aguerrido pool de empresas midiáticas. O assunto da prisão no aeroporto de Heatrow (Londres), por algumas horas, do namorado do jornalista norte-americano Glenn Greenwald, responsável por ajudar na divulgação das denúncias e documentos de outro norte-americano Edward Snowden (este, antigo funcionário da NSA americana), recebeu formidável espaço na mídia imprensa e na mídia televisiva. Contraste flagrante com o pouco caso com que essa mesma mídia abordou a questão que a todos interessa – sob o pretexto de preservar sua soberania nacional às custas da soberania de outras nações que, no caso do Brasil, trata-se nada menos que uma nação historicamente amiga.

Façamos um segundo exercício mental. É o seguinte:

Qual seria a reação da mídia brasileira, de sua maior rede de televisão aberta, de seus principais jornais e revistas impressos, se os e-mails, telefonemas e documentos da própria presidenta Dilma Rousseff fossem espionados pelo governo cubano?

E se o fossem pelo governo russo?

E se o fossem pelo governo venezuelano?

E se o fossem pelo governo iraniano?

O presente tema objeto deste prosaico artigo nos convida a uma vigorosa reflexão sobre a aplicação do “dois pesos duas medidas” no fazer jornalístico do Brasil, ajuda a desvelar a teia de interesses escusos, sejam ideológicos, sejam partidários, que há muito minam a credibilidade dessa importante força motriz de uma sociedade justa e equânime, amante da liberdade e defensora dos direitos das populações vulneráveis – a imprensa.
A humanidade tem sido vítima constante de ambições imperialistas do Norte e do Sul, de sistemas ideológicos que privilegiam o mercado em detrimento do ser humano, de organismos multilaterais, como a Organização das Nações Unidas, com legitimidade crescentemente questionável, em que menos que meia dúzia de nações impõe sua vontade e suas agendas política e econômica aos restantes 196 países, que não titubeiam em declarar guerras a seu bel prazer, seja para movimentar sua portentosa indústria bélica, seja para se apoderar de valiosas fontes de recursos energéticos ou, tão-somente, fortalecer a insidiosa dualidade do eu-produtor e todo-o-resto-do-mundo-consumidor. Estamos testemunhando uma época de absoluta carência de grandes líderes, de grandes estadistas, de grande pensadores que consigam entender que toda a humanidade tem um só destino, um destino inescapável e comum a todos, um destino que se imanta à percepção de que aquilo que infelicita parte infelicita o todo. Somos, a bem dizer, nada mais que um só planeta e um só povo.

Washington Araújo é jornalista e escritor. Mestre em Comunicação pela UNB, tem livros sobre mídia, direitos humanos e ética publicados no Brasil, Argentina, Espanha, México. Tem o blog http://www.cidadaodomundo.org
Email - wlaraujo9@gmail.com

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Dilma critica incisivame​nte EUA na ONU e propõe governança global para internet

Dilma Vana Rousseff, uma mulher de coragem! Viva a nossa Presidenta!
 
Se ainda estivéssemos sob o (des)governo submisso de FHC, este vira-lata estaria lá ,de quatro no plenário, abanando seu rabinho para Obama.
 
 
 
 
 
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Íntegra do discurso da Presidenta Dilma:

 
 
 
 
Quarta-Feira, 25 de Setembro de 2013
 

 

Dilma critica EUA na ONU e propõe governança global para internet

 
 
Najla Passos
 
 
 
 
Brasília - A presidenta Dilma Rousseff condenou a espionagem norte-americana e propôs uma governança global para a internet, durante seu discurso na abertura da 68ª Assembleia da ONU, nesta terça (24), em Nova York, conforme previsto. O surpreendente foi a forma incisiva como o fez.Imiscuir-se dessa forma na vida de outros países fere o direito internacional e afronta os princípios que devem reger as relações entre eles, sobretudo entre nações amigas”, afirmou perante os líderes de países que compõe o organismo internacional.

Dilma Rousseff lembrou que as recentes revelações sobre as atividades de espionagem da Agência de Segurança Norte-americana (NSA) provocaram indignação e repúdio em amplos setores da opinião pública mundial, e em especial no Brasil, em que cidadãos, empresas, representações diplomáticas e até a própria presidência da república foram alvos da interceptação ilegal de dados.

Jamais pode uma soberania firmar-se em detrimento de outra soberania. Jamais pode o direito à segurança de um país ser garantido mediante a violação de direitos humanos e civis fundamentais dos cidadãos de outro país”, ressaltou a presidenta.

Ela sustentou também que, apesar das tentativas bilaterais do governo brasileiro para solucionar o impasse, o governo dos Estados Unidos não apresentou respostas satisfatórias. “Não se sustentam os argumentos de que a interceptação ilegal de informações e dados destina-se a proteger as nações contra o terrorismo. (...) Somos um país democrático, cercado de países democráticos, pacíficos e respeitosos do direito internacional”, argumentou.

A presidenta disse que o Brasil redobrará os esforços para dotar-se de legislação, tecnologias e mecanismos que nos protegem da intercepção ilegal de comunicações e dados. Mas defendeu que o problema transcende o relacionamento bilateral Brasil – Estados Unidos, já afeta toda a comunidade internacional e, por isso, precisa ser resolvido no âmbito da ONU. Esse é o momento para criarmos as condições para evitarmos que o espaço cibernético seja instrumentalizado como arma de guerra, por meio da espionagem da sabotagem, dos ataques contra sistemas e infraestruturas de outros países”, defendeu.

Ao defender que a ONU atue para regular a rede mundial de computadores, Dilma afirmou que apresentará propostas concretas para o estabelecimento de marco civil multilateral para governança e uso da internet, além de medidas que garantam proteção para os dados que nela trafega. Segundo ela, as propostas contemplam cinco eixos, que tem como base principal o princípio da neutralidade da rede, ou seja, que o tráfego de dados não possa ser afetado por interesses políticos, econômicos religiosos ou quaisquer outros que não sejam de caráter técnico ou ético.
Os demais eixos incluem a garantia de princípios fundamentais, como a liberdade de expressão, a privacidade do indivíduo e respeito aos direitos humanos; a governança democrática, multilateral e aberta, exercida com transparência: a universalidade que assegura desenvolvimento social e humano e a construção de sociedades inclusivas e não discriminatórias; e a diversidade cultural, sem imposição de crenças costumes e valores.

Para o jornal inglês The Guardian, o pronunciamento de Dilma foi um recado direto ao presidente Barack Obama, que aguardava nos bastidores para fazer seu discurso, e “representou o tratamento mais duro dado até agora por um chefe de Estado às revelações feitas pelo ex-terceirizado da NSA, Eduard Snowden”. Obama não apareceu na plenária durante a fala da brasileira.

Bolsa Família: Efeito preguiça é mito


 
 
 
Uma década de Bolsa Família: Efeito preguiça é mito
 
 
Artigo de Laís Abramo* e José Ribeiro**
 
 
 
Uma década de Bolsa Família: Efeito preguiça é mito
 
 
No momento em que o programa Bolsa Família completa 10 anos, é louvável a disposição do governo brasileiro de abrir-se ao diálogo com outras instituições e setores da sociedade para analisar e refletir sobre suas estratégias, resultados, avanços e desafios. O Ciclo de Debates 10 Anos do Programa Bolsa Família: Avanços, Efeitos e Desafios, organizado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), Organização Internacional do Trabalho (OIT) e Associação Brasileira de Estudos Populacionais (Abep), realizado em Brasília, discutiu os efeitos dos programas de transferência de renda no trabalho das pessoas.

Para a OIT, o trabalho é um dos principais vínculos entre o desenvolvimento econômico e o social. Segundo dados da Pnad (IBGE/2011), 77% da renda familiar advêm do trabalho, sendo estratégico no combate à pobreza. Não é qualquer trabalho que garante o acesso a uma vida digna, mas um trabalho decente. Além de remuneração adequada, acesso a direitos e à proteção social, combinados com incrementos de produtividade e igualdade de oportunidades, diminui a extrema pobreza por meio do aumento e distribuição da renda.

A experiência brasileira recente de redução da pobreza e da desigualdade social, resultado de políticas de caráter redistributivo, objetiva a incluir nos mercados de consumo e de trabalho parcelas da população até então excluídas da cidadania. Os resultados se devem a uma combinação entre políticas sociais e laborais. A maioria das análises realizadas aponta como responsáveis: Bolsa Família, extensão da proteção social e fatores relacionados ao mercado de trabalho, como o aumento do emprego formal e a valorização do salário-mínimo. Entre 2003 e 2013 foram gerados 19 milhões de empregos formais, e o salário-mínimo aumentou 70,5% em termos reais. Este aumento foi fundamental no combate à pobreza e à desigualdade, pois atingiu principalmente a população trabalhadora situada na base da pirâmide salarial, predominantemente composta por mulheres e negros. Se na população ocupada o rendimento médio real aumentou 30% (2004-2011), a expansão foi de 36% entre as mulheres, 44% para os negros e 47% entre as negras.
Outra questão debatida é o efeito do Bolsa Família sobre a disposição para o trabalho dos seus beneficiários, e suas possibilidades de autonomia econômica pela inclusão produtiva. Declarações ideologizadas, preconceituosas e destituídas de evidências empíricas sugerem que o Bolsa Família estimula o "efeito preguiça" entre os beneficiários. Mas, segundo a Pnad 2011, entre as famílias com rendimento mensal per capita de até 1/4 do salário mínimo (as mais pobres), 62% da renda familiar advêm do trabalho. Este dado corrobora as informações do Cadastro Único do governo federal, de que a maioria da população pobre e beneficiária do programa de fato trabalha. Entretanto, são em sua maioria trabalhos precários e informais. Urge que o país continue desenvolvendo políticas e iniciativas de combate à pobreza por meio do trabalho decente.

(*) Laís Abramo é diretora da Organização Internacional do Trabalho no Brasil
(**) José Ribeiro é especialista em estatísticas laborais da OIT

'The Guardian' destaca ataque de Dilma a EUA e vigilância da NSA

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Quarta-Feira, 25 de Setembro de 2013

 
 
'The Guardian' destaca ataque de Dilma a EUA e vigilância da NSA
 
 
Julian Borger - The Guardian



A presidenta do Brasil, Dilma Rousseff, lançou, durante a Assembleia Geral da ONU, um forte ataque à espionagem feita pelos EUA, acusando a NSA de violar leis internacionais por causa da coleta indiscriminada de dados e informações pessoais de cidadãos brasileiros e da espionagem industrial, voltada para alvos estratégicos.
O agressivo discurso de Dilma foi um desafio direto ao presidente dos EUA Barack Obama, que esperava nos bastidores para fazer seu discurso à Assembleia Geral, além de ser um dos maiores abalos diplomáticos até hoje, por causa das revelações do antigo funcionário da NSA, Edward Snowden.

Dilma já havia cancelado uma viagem a Washington em protesto contra a espionagem estadunidense, depois de documentos vazados por Snowden revelarem que a agência de espionagem dos EUA havia monitorado os telefonemas da presidenta, de embaixadas brasileiras e espionado a companhia estatal de petróleo, a Petrobras.

Dados pessoais de cidadãos foram interceptados indiscriminadamente. Informações empresariais – muitas vezes, de alto valor econômico e mesmo estratégico – estiveram na mira da espionagem. Também representações diplomáticas brasileiras, entre elas a missão permanente nas Nações Unidas e a própria Presidência da República, tiveram suas comunicações interceptadas”, disse Dilma, num clamor global contra o que ela classificou de poder sem limites do aparato de segurança dos EUA.

Esse tipo de intromissão nos assuntos internos de outros países é uma violação ao direito internacional e uma afronta aos princípios que devem regê-lo, especialmente entre nações amigas. Uma nação soberana nunca pode se afirmar em detrimento da soberania de outra nação. Jamais pode o direito à segurança dos cidadãos de um país ser garantido mediante a violação de direitos humanos e fundamentais dos cidadãos de outro país.”

Os esforços de Washington de amenizar a fúria brasileira com a espionagem da NSA foram repelidas pela presidenta, que tem feito propostas para que o Brasil tenha sua própria estrutura de internet.

Governos e sociedades amigos que buscam construir uma parceria verdadeira e estratégica, como é o nosso caso, não pode permitir que ações ilegais recorrentes aconteçam como se fossem normais. Elas são inaceitáveis”, disse.

Não se sustentam argumentos de que a interceptação ilegal de informações e dados destina-se a proteger nações contra o terrorismo. O Brasil sabe proteger-se. Repudia, combate e não dá abrigo a grupos terroristas”, disse Dilma.

“Como muitos latinoamericanos, eu lutei contra o autoritarismo e a censura, e não posso deixar de defender, de maneira incondicional, o direito à privacidade das pessoas e a soberania do meu país”, falou a presidenta brasileira. Ela foi presa e torturada por ter participado de um movimento guerrilheiro de oposição ao regime ditatorial militar brasileiro nos anos 1970.

Sem o direito à privacidade, não há liberdade de expressão e opinião verdadeiros, e portanto, não há democracia. Na ausência do respeito à soberania, não há base para a relação entre nações.”

Dilma conclamou a ONU a liderar um novo sistema global para governar a internet. Ela disse que um organismo multilateral como esse deve garantir “a liberdade de expressão, a privacidade individual e o respeito aos direitos humanos”, além da “neutralidade da rede, guiada apenas por critérios éticos e técnicos, sendo inadmissível a restrição , seja por motivos políticos, comerciais ou religiosos, ou de qualquer outro tipo.”

“Este é o momento de criarmos as condições para evitar que o espaço cibernético seja instrumentalizado como arma de guerra por meio da espionagem, da sabotagem, dos ataques contra o sistema e infraestrutura de outros países”, disse a presidenta brasileira.

Como anfitrião da sede da ONU, os EUA foram criticados pela Assembleia Geral da ONU diversas vezes no passado, mas o que fez a denúncia de Dilma Rousseff ainda mais dolorosa, diplomaticamente, foi o fato de ela ter falado em nome de um Estado enorme, cada vez mais poderoso e historicamente aliado.

terça-feira, 24 de setembro de 2013

Dilma na ONU: “Especiali​stas” brasileiro​s não gostam

 
 
24/09/2013
 
 
Dilma fala na ONU: perdeu, cowboy! “Especialistas” brasileiros não gostam
 
 
 
Por Rodrigo Vianna
 
Jornais de fora destacam Dilma. Veja critica.
 
 
Dilma foi à ONU e fez o esperado de uma presidenta que defende o interesse nacional: espinafrou Obama pela espionagem ao Palácio do Planalto, à Petrobrás e aos brasileiros em geral. Perdeu, cowboy! Não estamos no velho oeste. Ou estamos?
Dilma não fez isso por ser de “esquerda”. Dos últimos presidentes brasileiros, creio que quase todos fariam o mesmo, com mais ou menos ênfase: Sarney, Itamar, Lula, até Collor. Quanto a FHC, não sei, sinceramente.
Tão esperada quanto a postura altiva de Dilma foi a reação de certos “especialistas” ouvidos por nossa imprensa. Terminado o discurso da presidenta, ouço numa rádio em São Paulo um jovem “especialista” em relações internacionais. A avaliação dele é a seguinte (não são palavras textuais; resumo o que escuto enquanto dirijo pelas ruas engarrafadas): “tanto faz o conteúdo do discurso, fale o que quiser a presidenta isso não muda nada, espionagem é algo comum e vai ser sempre assim”. O jornalista da rádio, timidamente, insiste: “mas aí não seria tomar a atitude errada como normal?”. E o “especialista”  (da ESPM – Escola Superior de Propaganda e Marketing; não consegui anotar o nome dele) responde: “não, veja, querer acabar com espionagem é como querer proibir o drible no futebol.”
Sofista. Da pior qualidade. Que bobagem colossal. Não, caro especialista, sua metáfora está equivocada. Se quisermos manter o debate no campo do futebol, eu diria que aceitar a espionagem como “normal” ou “comum” seria como dizer assim: “todo jogo de futebol sempre vai ter cotovelada, ou juiz comprado; então, é besteira reclamar; o negócio é dar cotovelada ou comprar o juiz também.”
Já houve um tempo, caro especialista, em que o mundo aceitava como “comum” a tortura. Ah, se todos torturam na guerra, vamos fazer o mesmo então? Não. O mundo caminhou para estabelecer tratados que tentam banir a tortura. O caminho é longo, mas o princípio foi estabelecido.
Não à barbárie. Sim à defesa do interesse nacional. Nada melhor do que uma presidente que já sofreu tortura de um regime autoritário para dar esse “chega pra lá” no vale-tudo. Sim, a presidenta que “não pode entrar nos EUA porque é terrorista” (lembram como ouvíamos isso em 2010, durante a campanha?) foi à ONU e disse o que os Estados Unidos não queriam ouvir: alto lá, vocês não podem tudo!
Da mesma forma, o uso das armas químicas poderia ser encarado como “normal”. Ah, não adianta reclamar , certo? É uma arma à disposição, todos vão usar – certo? Nem Obama pensa assim (ainda que saibamos que a censura ao uso das armas químicas na Síria, por parte do EUA, seja hipócrita, já que Obama tolera armas químicas, desde que estejam nas mãos “certas”). Mas vale o mesmo raciocínio: o mundo concordou que é necessário criar regras para evitar o uso das armas químicas numa barbárie total.
O argumento do “especialista” da rádio é o da guerra de todos contra todos. É o vale-tudo. Na verdade, é apenas um sofisma para minimizar a ação altiva de Dilma, e para justificar a posição que durante tantos anos adotamos aqui no Brasil: “ah, os EUA são mais fortes; aceitemos a realidade, e tiremos os sapatos pra eles”. Nas redes sociais e nas ruas, esse mesmo pensamento encontra algum eco. É o servilismo travestido de “pragmatismo” rastaquera: o mundo é assim, que fazer.
A naturalização do uso da força já serviu pra justificar escravidão (“o mundo é assim, há senhores e escravos”), e a manutenção do domínio colonial (“o mundo é assim, há povos que nasceram para comandar, outros nasceram pra ser comandados). Ouvir essas bobagens de um inglês do século XIX ou início do século XX seria até compreensível: estaria defendendo os interesses do Império Britânico. Ouvir isso de um “especialista” brasileiro no século XXI é a constatação de que o caminho para a libertação nacional é longo. Os principais inimigos estão aqui dentro: nas universidades, na mídia, nas classes médias que compram o “ah, isso é normal, os EUA têm mais é que espionar mesmo”.
Raciocínio subserviente; e tosco, além de tudo. Porque, se é verdade que a espionagem não vai acabar, parece óbvio que a melhor forma de criar algumas regras para evitar a barbárie completa nessa área é constranger o “espião”. Constranger o mais forte, às vezes, é uma forma de tornar o mundo menos bárbaro. Expor e denunciar o uso abusivo da força é uma estratégia inteligente e necessária. Foi assim que as mulheres conseguiram impor leis que penalizam aqueles homens que usam a força para cometer abusos sexuais. No passado, o abuso era tolerado dentro de um casal  (“normal”, o marido ou parceiro é mais forte, fazer o que…).
Para concluir, uma ressalva: precisamos, sim, lutar contra a barbárie do vale-tudo no campo da informação e da comunicação; mas devemos estar preparados para o caso da barbárie internacional se impor. Ou seja: devemos denunciar o vale-tudo dos EUA, e ao mesmo tempo devemos equipar nosso Estado, criando sistemas de inteligência dignos desse nome. Enquanto o antigo SNI (ABIN) seguir a  concentrar esforços na espionagem de movimentos sociais (sindicatos, MST etc), em vez de defender o interesse nacional, estamos fritos.
O mundo precisa criar regras para frear a arrogância dos Estados Unidos. Isso não é anti-americanismo. Isso é o óbvio ululante, se buscamos um mundo melhor. Gostem ou não nossos jovens “especialistas”.


segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Roda Viva se tornou um boteco de conservado​res

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Segunda-Feira, 23 de Setembro de 2013
 
 
 

Roda Viva se tornou um boteco de conservadores

 
 
Caio Sarack
 
 
 
São os embates entre pressupostos críticos que dão luz a um debate, e é esta a grande perda do programa Roda Viva desde a entrada de Augusto Nunes. A condução de Nunes não chegou nem ao seu décimo programa e já foi suficiente pra tirar qualquer dúvida que se possa ter sobre a nova conformação do Roda Viva.

Frases como “não há expoente maior da esquerda que Fernando Henrique Cardoso, enquanto outros propugnavam por salários melhores e ditaduras de outra natureza”, do ex-ministro do STF nos dois anos Collor, Francisco Rezek, mostram - e resumem - que matiz assumiu o programa da TV Cultura. Já desde a saída de Mario Sergio Conti, ilustrado e aristocrático, mas muito mais contido ideologicamente, o programa se tornou uma espécie de cobertura ao vivo, fora do horário comercial, das mais conservadoras redações.

Estadão, Folha, Veja, todos na bancada.
O debate vai se suavizando e se transforma numa conversa casual, um papo entre amigos. Rigor dá lugar ao mais maniqueísta achismo, um boteco televisionado.

Espionagem americana: nada de novo no front, nós que entendamos o consolidado modo de fazer política no mundo, disse o jurista Rezek. Bolívia e o senador exilado: sentimento de orfandade dos diplomatas explica o impulso de Eduardo Saboia. A capa do supremo parecia estar ainda nas costas do ex-ministro, mas a capa quem pôs não foi o próprio ministro. Indulgentes a todas respostas, os entrevistadores pareciam completar-se, consolidavam suas opiniões e nada mais. O ex-ministro tem um fortíssimo vício: a mais habitual e deteriorada “social-democracia” neoliberal.
E como um bom social-democrata brasileiro - com todas as suas ideias fora do lugar - não questiona seu tio favorito. Os Estados Unidos nada mais fazem do que é habitual, segundo o ex-ministro, cabe a quem espionar o mérito de não ser pego, isto é, nada passa de uma questão de competência. Qualquer tentativa de criar uma lei internacional que queira dar cabo dessas intromissões, sempre segundo o jurista, é ridiculamente ingênua.

O contra-argumento de que agora as cartas estão na mesa e por isso é melhor que assim seja, não passa de ingenuidade: o mediador usa os termos que cunha em suas colunas, a bancada endossa e mais: o entrevistado concorda. As contradições não se expressam, porque não há contradição. O centro reproduz as beiradas.
A maior questão está, no entanto, na constante pauta conservadora do programa, o que antes chegava no pluralismo formal (também ruim e insuficiente) mas competente de Mario Sergio Conti, hoje chega em níveis absurdos de parcialidade panfletária. 

A tevê pública tomou forma como espelho do velho mercado conservador que não caduca nunca. A perda do Roda Viva não foi só pela falta de competência de quem agora media as perguntas da bancada e respostas do entrevistado, mas também porque o programa não esgarça qualquer questão. O diagnóstico conservador perpassa todos os momentos do programa, até mesmo as perguntas mais diretas, "o senhor é a favor do embargos infringentes?", são interrompidas por postulados arrogantes. O jurista não se mostra a favor ou contra, não o deixam, não se faz questão de nada novo. Fizeram o mesmo com Miguel Reale Jr (no programa de estreia de Nunes), quando citou o caso do mensalão tucano e nada de lá foi extraído, nem mesmo a presença de Raimundo Rodrigues Pereira conseguiu dar ânimo às controvérsias da Ação Penal 470.

Desde a seleção cuidadosa de quem estará no centro da roda até a bancada estupidamente unânime o programa se transforma no espaço de moralização e superfície.
 
Caio Sarack é estudante de filosofia na USP e estagiário da Carta Maior.

Por que só agora Ives Gandra Martins disse que Dirceu foi condenado sem provas?

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Folha.com, 22/09/2013



Dirceu foi condenado sem provas, diz Ives Gandra


MÔNICA BERGAMO COLUNISTA DA FOLHA



O ex-ministro José Dirceu foi condenado sem provas. A teoria do domínio do fato foi adotada de forma inédita pelo STF (Supremo Tribunal Federal) para condená-lo.
Sua adoção traz uma insegurança jurídica "monumental": a partir de agora, mesmo um inocente pode ser condenado com base apenas em presunções e indícios.
Quem diz isso não é um petista fiel ao principal réu do mensalão. E sim o jurista Ives Gandra Martins, 78, que se situa no polo oposto do espectro político e divergiu "sempre e muito" de Dirceu.
Com 56 anos de advocacia e dezenas de livros publicados, inclusive em parceria com alguns ministros do STF, Gandra, professor emérito da Universidade Mackenzie, da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e da Escola Superior de Guerra, diz que o julgamento do escândalo do mensalão tem dois lados.
Um deles é positivo: abre a expectativa de "um novo país" em que políticos corruptos seriam punidos.
O outro é ruim e perigoso pois a corte teria abandonado o princípio fundamental de que a dúvida deve sempre favorecer o réu.


Folha - O senhor já falou que o julgamento teve um lado bom e um lado ruim. Vamos começar pelo primeiro.
Ives Gandra Martins - O povo tem um desconforto enorme. Acha que todos os políticos são corruptos e que a impunidade reina em todas as esferas de governo. O mensalão como que abriu uma janela em um ambiente fechado para entrar o ar novo, em um novo país em que haveria a punição dos que praticam crimes. Esse é o lado indiscutivelmente positivo. Do ponto de vista jurídico, eu não aceito a teoria do domínio do fato.


Por quê?
Com ela, eu passo a trabalhar com indícios e presunções. Eu não busco a verdade material. Você tem pessoas que trabalham com você. Uma delas comete um crime e o atribui a você. E você não sabe de nada. Não há nenhuma prova senão o depoimento dela - e basta um só depoimento. Como você é a chefe dela, pela teoria do domínio do fato, está condenada, você deveria saber. Todos os executivos brasileiros correm agora esse risco. É uma insegurança jurídica monumental. Como um velho advogado, com 56 anos de advocacia, isso me preocupa. A teoria que sempre prevaleceu no Supremo foi a do "in dubio pro reo" [a dúvida favorece o réu].


Houve uma mudança nesse julgamento?
O domínio do fato é novidade absoluta no Supremo. Nunca houve essa teoria. Foi inventada, tiraram de um autor alemão, mas também na Alemanha ela não é aplicada. E foi com base nela que condenaram José Dirceu como chefe de quadrilha [do mensalão]. Aliás, pela teoria do domínio do fato, o maior beneficiário era o presidente Lula, o que vale dizer que se trouxe a teoria pela metade.


O domínio do fato e o "in dubio pro reo" são excludentes?
Não há possibilidade de convivência. Se eu tiver a prova material do crime, eu não preciso da teoria do domínio do fato [para condenar].


E no caso do mensalão?
Eu li todo o processo sobre o José Dirceu, ele me mandou. Nós nos conhecemos desde os tempos em que debatíamos no programa do Ferreira Netto na TV [na década de 1980]. Eu me dou bem com o Zé, apesar de termos divergido sempre e muito. Não há provas contra ele. Nos embargos infringentes, o Dirceu dificilmente vai ser condenado pelo crime de quadrilha.


O "in dubio pro reo" não serviu historicamente para justificar a impunidade?
Facilita a impunidade se você não conseguir provar, indiscutivelmente. O Ministério Público e a polícia têm que ter solidez na acusação. É mais difícil. Mas eles têm instrumentos para isso. Agora, num regime democrático, evita muitas injustiças diante do poder. A Constituição assegura a ampla defesa - ampla é adjetivo de uma densidade impressionante. Todos pensam que o processo penal é a defesa da sociedade. Não. Ele objetiva fundamentalmente a defesa do acusado.


E a sociedade?
A sociedade já está se defendendo tendo todo o seu aparelho para condenar. O que nós temos que ter no processo democrático é o direito do acusado de se defender. Ou a sociedade faria justiça pelas próprias mãos.


Discutiu-se muito nos últimos dias sobre o clamor popular e a pressão da mídia sobre o STF. O que pensa disso?
O ministro Marco Aurélio [Mello] deu a entender, no voto dele [contra os embargos infringentes], que houve essa pressão. Mas o próprio Marco Aurélio nunca deu atenção à mídia. O [ministro] Gilmar Mendes nunca deu atenção à mídia, sempre votou como quis. Eles estão preocupados, na verdade, com a reação da sociedade. Nesse caso se discute pela primeira vez no Brasil, em profundidade, se os políticos desonestos devem ou não ser punidos. O fato de ter juntado 40 réus e se transformado num caso político tornou o julgamento paradigmático: vamos ou não entrar em uma nova era? E o Supremo sentiu o peso da decisão. Tudo isso influenciou para a adoção da teoria do domínio do fato.


Algum ministro pode ter votado pressionado?
Normalmente, eles não deveriam. Eu não saberia dizer. Teria que perguntar a cada um. É possível. Eu diria que indiscutivelmente, graças à televisão, o Supremo foi colocado numa posição de muitas vezes representar tudo o que a sociedade quer ou o que ela não quer. Eles estão na verdade é na berlinda. A televisão põe o Supremo na berlinda. Mas eu creio que cada um deles decidiu de acordo com as suas convicções pessoais, em que pode ter entrado inclusive convicções também de natureza política.


Foi um julgamento político?
Pode ter alguma conotação política. Aliás o Marco Aurélio deu bem essa conotação. E o Gilmar também. Disse que esse é um caso que abala a estrutura da política. Os tribunais do mundo inteiro são cortes políticas também, no sentido de manter a estabilidade das instituições. A função da Suprema Corte é menos fazer justiça e mais dar essa estabilidade. Todos os ministros têm suas posições, políticas inclusive.


Isso conta na hora em que eles vão julgar?
Conta. Como nos EUA conta. Mas, na prática, os ministros estão sempre acobertados pelo direito. São todos grandes juristas.


Como o senhor vê a atuação do ministro Ricardo Lewandowski, relator do caso?
Ele ficou exatamente no direito e foi sacrificado por isso na população. Mas foi mantendo a postura, com tranquilidade e integridade. Na comunidade jurídica, continua bem visto, como um homem com a coragem de ter enfrentado tudo sozinho.


E Joaquim Barbosa?
É extremamente culto. No tribunal, é duro e às vezes indelicado com os colegas. Até o governo Lula, os ministros tinham debates duros, mas extremamente respeitosos. Agora, não. Mudou um pouco o estilo. Houve uma mudança de perfil.


Em que sentido?
Sempre houve, em outros governos, um intervalo de três a quatro anos entre a nomeação dos ministros. Os novos se adaptavam à tradição do Supremo. Na era Lula, nove se aposentaram e foram substituídos. A mudança foi rápida. O Supremo tinha uma tradição que era seguida. Agora, são 11 unidades decidindo individualmente.


E que tradição foi quebrada?
A tradição, por exemplo, de nunca invadir as competências [de outro poder] não existe mais. O STF virou um legislador ativo. Pelo artigo 49, inciso 11, da Constituição, Congresso pode anular decisões do Supremo. E, se houver um conflito entre os poderes, o Congresso pode chamar as Forças Armadas. É um risco que tem que ser evitado. Pela tradição, num julgamento como o do mensalão, eles julgariam em função do "in dubio pro reo". Pode ser que reflua e que o Supremo volte a ser como era antigamente. É possível que, para outros [julgamentos], voltem a adotar a teoria do "in dubio pro reo".


Por que o senhor acha isso?
Porque a teoria do domínio do fato traz insegurança para todo mundo. 



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DEMOROU, IVES GANDRA



23 DE SETEMBRO DE 2013 ÀS 07:13

Por que só agora Ives Gandra disse que Dirceu foi condenado sem provas?

Por Paulo Nogueira, do Diário do Centro do Mundo - Data vênia, eu gostaria de saber por que só agora, tanto tempo depois, o jurista Ives Gandra disse publicamente que Zé Dirceu foi condenado sem provas.
A afirmação de Gandra foi o ponto alto de uma entrevista que ele concedeu à jornalista Mônica Bérgamo, da Folha. A entrevista é um dos assuntos mais discutidos neste final de semana na internet.
Gandra teve todas as oportunidades possíveis para dar sua opinião – influente, vistas suas credenciais de jurista e, mais ainda, sua conhecida falta de simpatia pelo PT.
Poderia ser num artigo, poderia ser numa entrevista – chances não faltaram.
Por que agora e não antes? Lembremos: no final do ano, Dirceu estava com as malas prontas para ir para a cadeia. Se as coisas seguissem o rumo que parecia que seria tomado, a declaração de Gandra seria um insulto a mais a Dirceu, dada a sua extemporaneidade.
Minha impressão é que Gandra, de alguma forma, sabia que as portas da mídia sempre tão abertas se fechariam para ele caso defendesse Dirceu e acusasse o STF de má conduta.
Se ele pensou isso, estava mais que certo. A mídia tradicional – excetuada, aqui e ali, a Folha – só dá espaço a quem escreve o que os donos querem que seja dito.
Gandra seria posto na geladeira, como provavelmente acontecerá agora. Ou alguém imagina que a Veja vá dar Amarelas com ele para expor seus pontos, entre os quais, aliás, figura um elogio tórrido à “coragem” de Lewandowski em ficar sozinho contra a manada? Alguém concebe Gandra em qualquer programa de entrevistas da Globonews ou da CBN?
Gandra provavelmente não quis se opor à, bem, à manada comandada pela mídia.
Mas.
Mas há uma questão de consciência que deveria se sobrepor. Foi o que fez Celso de Mello ao acolher – sob massacrante pressão da mídia e de pares como Marco Aurélio de Mello e Gilmar Mendes – os chamados embargos infringentes.
É possível que, de alguma forma, Celso de Mello tenha inspirado Gandra.
Por isso, ainda que esta seja uma hipótese, seguem aqui os aplausos ao decano do STF.
Clap, clap, clap.
De pé.